20 de março de 2011

Torture Squad: entrevista exclusiva com a banda

O Torture Squad, um dos grandes ícones da cena nacional, começou o ano de 2011 a todo vapor. Após lançar seu novo álbum, "AEquilibrium", a banda iniciou uma turnê pelo país, que inclui datas no nordeste, como no Abril Pró Rock, ao lado do D.R.I., no sul e no sudeste, como em São Paulo, junto com o Korzus, no dia 22 de maio. Além disso, recentemente a banda passou por uma troca de guitarristas e ainda anunciou sua participação mais uma vez no gigante Wacken Open Air na Alemanha. Nessa longa, porém interessante e divertida entrevista, os caras contam com exclusividade para o Whiplash! sobre o novo álbum, planos e a entrada de André Evaristo no grupo.


Muitas das críticas acerca do AEquilibrium alegam que o som desse álbum está um pouco mais diversificado, porém ainda mantém a marca registrada do Torture Squad. Quando vocês terminaram a gravação do disco, que impacto vocês pensaram que isso poderia causar nos fãs?
Amilcar: Eu acho que o mesmo impacto que todos os álbuns vêm causando.
Em que sentido?
Vitor: Nesse sentido de “tá igual, mas tá diferente!”.
Amilcar: Eu adoro ouvir isso da galera! E faz sentido: está diferente porque usamos elementos diferentes que nunca tínhamos composto antes, mas está igual porque a nossa raiz está lá e sempre vai ser a mesma. Por exemplo, o blues na "The Spirit Never Dies": nós sempre curtimos blues e então chegou uma hora que houve uma necessidade natural de compor algo relacionado a isso. Então pegamos essa influência e trouxemos para a nossa raiz no thrash/death metal. Por isso digo que pra mim o impacto é o mesmo. Porém, uma coisa que vem me chamando a atenção é que os fãs mais antigos da banda parecem ter ‘captado’ melhor a mensagem do álbum de primeira. Aliás, não só os sons, mas também a capa. Nos outros álbuns, percebi que não houve isso, todos gostaram de primeira. Já nesse, o retorno positivo dos fãs antigos vem sendo mais imediato.
Vitor: Mas o mais importante é que o disco acabou causando impacto, mesmo uns digerindo de primeira e outros não.
Castor: E se você pegar disco por disco da banda, você vai encontrar exatamente isso: o igual, mas diferente. A "The Spirit Never Dies", por exemplo, já que acabamos de citá-la, tem a mesma levada e andamento da "Asylum of Shadows", que é do segundo disco. Tem o caso também da versão para "The Unholy Spell" desse álbum, que ficou no mesmo clima das outras músicas, mesmo sendo de uma fase mais antiga da gente. A maioria dos fãs que nos acompanham há vários álbuns sabem que sempre podem esperar algo novo, diferente.
Ainda na "The Spirit Never Dies", o que eu acho legal nesse lance de vocês misturarem suas influências ao som da banda, é que isso pode automaticamente fazer com que o fã amplie seus conhecimentos musicais. No caso dessa, pode haver fãs que comecem a buscar alguma coisa de blues pra ouvir, e isso vai ser por causa de vocês.
Vitor: Exatamente!
Castor: Por exemplo, o Iron Maiden, no EP da "Aces High" tem um cover de "Cross-Eyed Mary". Eu não conhecia Jethro Tull, e gostei tanto da música, que resolvi buscar a original, e acabei descobrindo o "Aqualung", que é um puta álbum!
Voltando às críticas, como vocês têm lidado com o respaldo de fãs e mídia?
Amilcar: Felizmente, a maioria das críticas tem falado muito bem do disco. Quando nós compomos, nós fazemos músicas que nos agradam, que a gente gosta. Então, quando o fã diz que gostou das músicas, pra mim, significa que ele sentiu a mesma coisa que nós sentimos quando as compusemos e tocamos. Então a gente pensa que se quando nós criamos algo, nós gostamos, temos certeza de que os fãs também gostarão. E se, por ventura, há alguém que não goste, essa é uma visão pessoal dele ou dela. Não se pode agradar a gregos e troianos e, na verdade, essa nem é a intenção. A intenção é criar algo honesto, que venha do coração, que venha de amar ser headbanger.
Castor: Na hora de compor, a gente pensa sempre como ela soaria se a gente estivesse do outro lado, do lado do fã. A gente coloca na música o que a gente realmente gostaria de ouvir nas bandas que a gente curte.
Vitor: Nunca fomos o tipo de banda que pensa em fazer música pra fazer sucesso. A gente compõe com o coração e deixa a música levar a gente.
Amilcar: Mas é claro que sempre vai rolar uma crítica ou outra com gente falando abobrinha, mas a gente quer mais é que se foda. Ops, pode falar palavrão? (risos)
Uma vez eu ouvi vocês comentarem que quando compuseram a "Storms", pensaram nela pra ser uma “música pra banguear”. Ao vivo, vocês acham que a intenção dessa e das outras músicas tem dado certo, de acordo com o que vocês esperavam que fosse?
Amilcar: Com certeza. Acho que quando ouvem o álbum, os fãs já sentem uma coisa legal, mas quando vêem a gente tocando ao vivo então, tocando com vontade, com feeling, ele acaba curtindo mais ainda as músicas.
Vitor: Tanto na "Storms", quanto no nosso blues, você vê claramente um êxtase na galera que consegue entrar na vibe das músicas.
Amilcar: A "Storms" têm referência de “bangueação” que vem de duas músicas do "Master of Puppets" (METALLICA): a "Orion" e a "The Thing That Should Not Be", que são sons que simplesmente não tem como não banguear quando se ouve.
Vocês sentiram alguma diferença no processo de composição entre os outros álbuns e o "AEquilibrium"? E agora com o André, como vocês acham que vai ser esse processo?
Amilcar: Eu acho que vai ser a mesma coisa e diferente ao mesmo tempo (risos).
Como assim?
Amilcar: Ah, vai ser a mesma coisa, porque compomos sempre do mesmo jeito: o Castor traz um riff, o Vitinho tem idéia para uma melodia de voz, ou até para uma ‘paradinha’, que acaba virando a cereja do bolo. Mas o que pode rolar agora com o André, é algo que não estamos muito habituados, apesar de estarmos abertos a fazer, que é chegar no estúdio e falar: “Hoje acho que a gente devia compor uma coisa mais puxada pra esse ou aquele clima” e criar ali na hora. Isso porque ele é headbanger pra caramba e muito versátil no instrumento, além de ser muito criativo, assim como o Vitinho. Acho que se a gente terminar a entrevista aqui, subir ali no estúdio e decidir compor algo, rola, e rola de uma forma bem bacana.
Vitor: Quanto ao "AEquilibrium", eu fiquei bem mais tranqüilo em relação às letras e à pronúncia. Nos outros, tudo também foi bem legal, mas nesse, a produção foi diferente. O Brendan sentava com a gente e analisava e corrigia as letras e isso me deixou completamente satisfeito com a voz no disco.
Castor: Até o timbre da sua voz está diferente, né?
Vitor: Ah sim! Nesse álbum eu preferi não ficar nem muito no agudo nem muito no grave.
Castor: Foi mais acompanhando o clima das músicas...
Amilcar: Tanto que o "AEquilibrium" foi o álbum que a galera mais elogiou a voz.
Tanto os fãs quanto a crítica especializada destacaram o álbum pela excelência alcançada por todos os instrumentistas. Mas, agora falando em tom mais pessoal, duas coisas que com certeza fizeram diferença nesse disco, foram as influências particulares que o Lopes introduziu em seus solos e também a opção de vocês em deixar o baixo sozinho segurando a base durante os solos. Quão importantes vocês acham que essas duas características foram para o “AEquilibrium”?
Castor: No estúdio a gente percebeu que em algumas músicas, com exceção da Generation Dead, esse esquema de deixar somente o baixo como cama durante as partes de solo funcionaram muito bem. Isso porque eu consegui tirar um timbre legal do meu equipamento e também porque o Brendan acabou dando algumas idéias, assim como o Adriano Daga, que também ajudou na hora de microfonar os amplificadores. Quanto ao Lopes, ele vem da escola mais nova do metal e tem uma pegada diferente, que acabou se encaixando bem com as músicas do "AEquilibrium".
Eu também acho que elas couberam legal nas músicas, tanto que, para mim, o solo da "The Spirit Never Dies" é um dos mais legais que existem, não só do TORTURE SQUAD, mas no geral mesmo!
Castor: O próprio André comentou comigo que esse solo é bem legal de tocar!
Amilcar: Pra você ver como são as coisas... Quando o Lopes compôs esse solo, eu ficava zuando com ele que pra mim parecia que, do nada, abria uma caixinha de música no meio do som! Porque eu estou no maior thrash na bateria, e o que eu esperava nessa parte era que entrasse um solo arregaçando tudo, e não uma melodia como essa. Eu não comentava nada, mas eu demorei bastante pra me acostumar com ele. Mas, na verdade, eu acho que todos os solos que ele fez são maravilhosos, mas tem um em especial que eu acho que é um dos melhores da banda, que é o da "Raise Your Horns". Ele é muito legal! Os solos dele, no geral, enriqueceram muito as músicas, e esse é o papel de um solo. Não que toda música tenha que ter um, mas quando rola, acho que é o ponto máximo da guitarra!
Castor: Pra mim, o solo da "Raise Your Horns" é parecido ao da "Beyond the Realms of Death", do JUDAS PRIEST, no Rock in Rio 2: é aquela melodia cantada, marcante, não se trata de técnica, de notas a milhão.
Amilcar: Quanto ao baixo, nós sempre demos muita importância para ele. Mas no caso da mixagem do "AEquilibrium", a gente finalmente conseguiu deixá-lo onde ele deveria ficar, pra todos perceberam que o baixo é tão importante quanto a guitarra. Como no RUSH, onde as linhas de baixo têm tantas melodias diferentes quanto a guitarra, a gente também gosta de dar esse destaque pro baixo.
Vitor: Na Azazel tem uma das minhas levadas favoritas no baixo nesse esquema de segurar a base!
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Qual música do "AEquilibrium" vocês acham que melhor define o momento da banda na época de composição e gravação do disco?
Amilcar: Pra mim, sem sombra de dúvidas, é a "Black Sun", porque ela foi composta durante a turnê na Europa, quando nós tínhamos alguns days off. Se bem que a "Raise Your Horns" também, mas ela eu meio que trabalhei mais na composição, porque as melodias vinham toda vez na minha cabeça quando a gente ia dar uma volta num parque, ou senão quando o Vitinho estava lá cozinhando pra gente, e eu chegava e falava “Vitinho, tive uma idéia! Acho que você vai curtir muito...” .
Castor: Eu lembro que até uma vez, nesse parque, você teve uma idéia pro baixo, que acabou se transformando no começo da música.
Vitor: O pior é que ao mesmo tempo em que eu estava concentrado no fogão, eu ficava empolgado com as músicas. Então, se alguma vez o rango queimou, foi por um bem maior, viu? (risos)
Amilcar: Mas eu acho que a "Black Sun" marca bastante desde quando o Lopes entrou na banda e já veio com aquele riff maravilhoso no começo dela, e depois vem outro tão maravilhoso quanto, de autoria do Castor, que é uma puta melodia no meio do thrash metal... Ali, todos realmente trabalharam pra que ela saísse e por isso eu acho que ela representa tanto!
Castor: Pra mim é difícil escolher, porque eu gosto desde a primeira nota da "Generation Dead", até o último toque da "The Unholy Spell". A que eu mais gosto é a "Azazel", mas se for pra escolher a que mais define o momento da banda naquela época, com certeza é a "Black Sun" mesmo.
Vitor: Eu concordo com os dois. A que eu mais gosto, inclusive de cantar, é a "Azazel", mas a que mais juntou tudo o que a banda tava passando na época, é mesmo a "Black Sun".
André: No meu caso, a música que eu mais me identifico e também acho que melhor define a banda no momento é a "The Spirit Never Dies". Primeiro porque eu sinto algo inexplicável em relação a ela, e segundo porque eu achei muito legal esse lance de criar uma ponte entre metal e blues, mostrando que a roupagem da música é diferente, mas as raízes estão lá! Assim como os caras do blues, que criavam instrumentoscom caixote no século 20, nossa música também nasce do protesto e do inconformismo. E eu não acho que ela resuma o Torture Squad, mas boa parte da essência da banda está ali!
Agora falando um pouco sobre as letras, o que eu pude reparar é que desde o "Hellbound" elas vêm se tornando mais diversificadas, adquirindo um cunho mais político, como a "Chaos Corporation", do próprio, e a "Holiday in Abu Ghraib" e "174", do "AEquilibrium". De onde surge a inspiração para esse tipo de composição?
Vitor: A inspiração vem da indignação. Indignação em ver muita coisa acontecendo por aí que você desaprova. Você é criado em uma família boa, sabendo o que é certo e o que é errado, e com o tempo começa a ver muita gente fazendo o que não devia, e isso acaba nos deixando meio p. da vida, e a forma que eu vejo de colocar tudo isso pra fora é através da letra e da música agressiva. Mas em relação às letras desse álbum, eu vou contar algo pra você em primeira mão! Existe meio que uma trilogia. Tudo começou com o "Pandemonium". O conteúdo ali é todo sanguinolento, tanto que até a capa é vermelha.
Castor: É o verdadeiro inferno (risos).
Vitor: Já o "Hellbound", se você cortar a própria palavra do título, você vai ver que tem a palavra ‘bound’, que vem de ‘boundaries’ que significa ‘fronteiras’ em inglês. Uma fronteira é algo que você pode ultrapassar, ou permanecer onde está. Então o "Hellbound" seria o nosso ‘purgatório’. Tanto que no encarte desse álbum, toda vez que a palavra ‘chaos’ aparece na letra, ela está em vermelho, exatamente por ainda ter uma ligação com o caos total que é o "Pandemonium". E tudo isso culminou no "AEquilibrium", que seria o nosso ‘céu’. O céu muita gente associa com anjinhos e Deus sentado no trono, mas para nós, não. No caso da nossa trilogia, esse paraíso seria o bem estar, o alcance do equilíbrio. E isso é o que importa, o que é essencial. Por exemplo: se você toma água em demasia, você passa mal, mas você também não consegue viver sem beber água. Deve-se ter um equilíbrio. Nós, os seres humanos, na verdade, estamos sempre em busca do nosso equilíbrio interior. Por isso nós afirmamos que esses três álbuns formam uma trilogia. Tanto que os nomes desses discos são formados por uma palavra só!
Quanto à saída do Augusto Lopes da banda, vocês lançaram uma nota à imprensa que continha até um depoimento do próprio guitarrista explicando seus motivos. Mas agora, do ponto de vista de vocês, como rolou a saída dele?
Amílcar: Completamente numa boa! Ele comentou que gostaria de voltar a produzir mais, uma vez que antes de entrar na banda ele já era produtor. E essa rotina que ele desejava não ia casar com a de uma banda na estrada. Nós respeitamos muito a decisão dele, porque cada um tem sua opinião.
Castor: Isso mesmo. Não teve briga, nem nada do gênero. E nós o entendemos, porque o Torture realmente toma muito tempo. Nós nos dedicamos muito, temos que fazer isso. É claro que temos coisas paralelas, mas eu diria que a banda é 99,9% da nossa vida!
Amílcar: Eu diria 100%, porque a nossa vida é toda moldada por causa da banda.
Castor: Com certeza! E o Lopes tinha essa necessidade de voltar a produzir, e a banda não dava tempo suficiente pra ele. Talvez ele se sentisse melhor dessa forma!
Como surgiu o estalo de chamar o André Evaristo em específico?
Amílcar: É difícil explicar, porque ele simplesmente veio na minha mente! Ele foi a primeira pessoa na qual pensei, e eu sempre tive a certeza de que se ele realmente viesse a entrar na banda, tudo o que está acontecendo agora, o lance da boa vibe e tudo o mais, rolaria naturalmente. Então o chamamos, e ele curtiu muito a idéia de fazer um teste com a gente, até porque ele já era fã da banda. Então ele veio, tocamos umas quatro músicas, e sentimos que seria ele! Ele se mostrou ser bem como a gente, dentro da realidade, sem frescuras, além de ser muito versátil na guitarra, e, o melhor, ser um baita headbanger!
André: Pra mim acho que foi como o Jason Newsted falava no começo. Demorou muito pra cair a ficha nele. Comigo é o mesmo! O que eu senti na hora é o mesmo que eu sinto agora: ainda estou me beliscando! Além de o gênero da banda ser o que eu gosto e me sinto bem tocando, eu sempre curti muito do trabalho do TORTURE SQUAD. Isso sem contar o clima com eles, que é maravilhoso.
Aproveitando o assunto, o que vocês acham que ele trouxe de novo, em termos de influência em composição, para a banda, além do fato de ele ser corinthiano, assim como todos vocês?
Amílcar: Esse é o ponto principal, agora fechou o ciclo! (risos)
Castor: Em termos de influência, acho que ele tem o mesmo gosto que o nosso, as mesmas influências, e o legal é que ele é um cara bem ‘fértil’, pois sempre mostra um riff ou ideia nova na guitarra. Em relação ao convívio, estamos há poucos meses com ele, mas parece que ele já é da banda há anos! Está sempre zoando, fazendo algum tipo de piada.
Vitor: O André é um cara talentoso e muito criativo. O fato de ele ensinar música também ajuda bastante, pois para isso ele tem que ouvir vários estilos de música. Então, ele já chegou na banda com uma bagagem enorme! Headbanger e corinthiano: quer presente melhor que esse? (risos) Poxa, o Cristiano era palmeirense, o Maurício, santista, o Lopes, são paulino... Então chegou o André pra fechar o ciclo! Agora sério, o André é um grande cara, muito criativo.
Amílcar: Tanto que ele já veio com uma música pronta pra mostrar pra gente. Como ele toca em umas três bandas e é da cena há muito tempo, ele tem várias músicas compostas e riffs de gaveta, aqueles que a gente guarda e acaba reutilizando mais pra frente. Ele já entrou com ‘sangue nos zóio’!
André: No fundo eu acho que as influências são as mesmas que as dos caras, apesar de eu ter feito um trabalho mais diferente, mais heavy, com o Magister. O meu background é o mesmo que o deles! Eu acho que o que eu posso acrescentar ao som da banda é o ‘mais do mesmo’, no bom sentido, porque eu venho da mesma escola que eles. Mas acho que dá pra trazer um pouquinho de cada coisa!
No dia 19 de fevereiro vocês tocariam no Ares Rock Camp, no show de estréia do André, nesse evento que contaria com várias bandas nacionais de peso, como HARPPIA e VOLCANO além de estrutura de camping, uma novidade no Brasil. Infelizmente o show foi cancelado, devido à baixa procura por ingressos. Primeiramente eu gostaria de saber a opinião de vocês sobre esse cancelamento e também gostaria de saber se vocês acham que isso reflete ou não a realidade de uma cena que não apóia bandas nacionais.
André: Sobre isso, eu acho que dessa vez aconteceu o inverso do que vem sempre ocorrendo. Antes, as mancadas vinham de produtores, de algumas casas de show que não cumpriam com a sua palavra e contrato. Mas dessa vez, faltou apoio do público, o que não é algo comum de se acontecer. Não houve procura de ingresso, o boca a boca não funcionou... Todo mundo fala mal do carnaval, mas não fez nada, dessa vez, para apoiar um evento desse porte. Eu acho que a moçada está muito acomodada em seu quarto fuçando na Internet. A galera que deveria sair pra balada pra curtir um som não está fazendo isso! Antigamente, com todas as dificuldades que a gente tinha, era insano, no bom sentido, sair pra ir a shows. Juntava toda aquela massa de cabeludos, com fitinha na mão e disco debaixo do braço trocando idéia e lotando os teatros, prestigiando muito as bandas conhecidas, mas respeitando muito as bandas iniciantes. Os caras pagam 400 reais para ver uma banda gringa, mas na hora de ver uma banda do bairro, parece não ter o mesmo valor!
Amílcar: Na verdade eu acho que é uma contradição grande, porque eu acredito que a cena é sim grande, é forte. Porém, tem algo faltando. Nós temos algumas mídias de Internet, rádio e televisão a cabo voltadas para a cena, mas o que eu acho que o headbanger sente falta é da magia. Não existe mais a magia. O que seria essa magia? A magia seria a gente ver bandas brasileiras de metal na televisão aberta, representando a gente ali, e dando mais vontade de ir lá, apoiar, assistir um show ao vivo dos caras. Temos muitas bandas grandes de metal, mas mesmo assim elas estão no underground. Não que isso seja ruim, mas a falta de maior exposição na mídia talvez dificulte mais o processo. A gente hoje tem uma boa base de fãs, porque estamos a muitos anos na estrada tocando e batalhando pra lançar álbuns. Por exemplo: no Rock Camp, nós íamos tocar com o VOLCANO, que é um dos ícones do metal mundial. O que falta para o headbanger aqui reconhecer isso? Falta um Headbanger’s Ball (N. da R.: Programa da MTV americana totalmente voltado para o metal, que exibia clipes e entrevistas durante os anos 90)? Acho que falta criar essa magia de volta. Isso seria fácil de acontecer, na minha opinião, se tivéssemos um programa de metal em TV aberta, para que todos pudessem ter acesso, seja na TV Cultura, na Gazeta ou até na MTV. Se bem que precisamos ser levados a sério e a MTV não leva o metal a sério. Eles sempre mostram o metal puxando para um lado humorístico, e não como o que é na verdade, um estilo de vida. Quando eu falo da TV, não quero parecer desmerecer os programas que já existem, como o Stay Heavy, o Sleevers, a TV Corsário, que são do caralho e são tão guerreiros quanto as bandas, ajudando a divulgar a cena, sem dúvida. Mas o que falta é um espaço nosso em TV aberta. A própria MTV, que é um canal de música, simplesmente não tem um espaço pra gente, que leva o metal tão a sério. Eu dou valor, e muito, para os programas que existem, mas que não existe mais um Fúria ou um Riff MTV, como antes tinha, também é uma realidade.
Castor: E isso tem fundamento, porque muitas das bandas que hoje eu conheço, foi porque na época via clipes passando na TV e me empolgava para ir atrás e conhecer mais do som daquele grupo.
Amílcar: Acho que se a galera visse mais o TORTURE SQUAD, o CLAUSTROFOBIA, o VOLCANO na TV, nos representando, se sentiriam mais empolgados.
Castor: E quanto ao lance de patrocinadores, isso também seria legal. Com certeza alguém que tenha uma loja ou alguma marca vai querer investir grana em algo que está aparecendo, que está tendo audiência. Ele vai conseguir visualizar de uma maneira mais clara um retorno garantido.
Vitor: Nós aqui somos todos da geração Rock in Rio 1 e 2. Eu lembro até hoje de como eu pirei vendo IRON MAIDEN, OZZY, AC/DC, JUDAS, KISS passando na televisão. Acho que falta a galera de hoje em dia ter direito de sentir essa paixão que a gente sentiu naquela época.
Amílcar: Pelo cancelamento, me pareceu que a galera não estava interessada em ir num festival de três dias, acampar, tomar uma, curtir com os amigos. Talvez porque tenham perdido essa magia em relação ao metal. Se bem que em Minas Gerais tem o Roça N’ Roll, onde tocamos no ano passado, que estava lotado de gente. Por isso é difícil de entender o que acontece.
Castor: Tem o Orquídea e o River Rock, no sul, também! No passado tinha o Brasil Metal Union também, que durou umas cinco edições e que poderia ter continuado.
Amílcar: Talvez o público não dê a atenção que as bandas nacionais deveriam ter.
Vitor: Dois fatores que eu acho que também deveriam ter e que seriam determinantes para que eventos como esse acontecessem, é o apoio da prefeitura, que pode sim patrocinar eventos, mas no nosso caso, além de esbarrar na burocracia de uma capital grande como São Paulo, ainda esbarra no preconceito com o estilo. Outra coisa, é que faltam investidores que acreditem e financiem pesado shows do tipo.
Foi recentemente divulgado na mídia que vocês vão tocar pela terceira vez no Wacken Open Air, o maior e mais tradicional festival de metal do mundo, que acontece anualmente na Alemanha. Como vocês receberam a notícia?
André: Eu me sinto vivendo um sonho. Parece que aquilo que eu imaginava com 16 anos, que era estar com uma banda tocando num baita festival como esse, pra um monte de gente, se tornou realidade.
Castor: Isso mesmo. Em 2007, fomos para participar e vencemos o Metal Battle, e em 2008 e agora em 2011 como banda convidada do festival mesmo. Para nós é sempre um orgulho imenso tocar lá! E dessa vez também vai ter o SEPULTURA, tocando lá pela primeira vez.
Aliás, já vou emendar uma pergunta que eu ia fazer mais pra frente. O Sepultura foi e é uma grande ícone do metal nacional. Uma vez me lembro de o Vitinho ter me falado que começou a cantar depois de ter ouvido o álbum Beneath the Remains. Agora, vocês, juntamente com esse grande nome tão importante para a cena mundial, serão os únicos representantes do Brasil no festival. Como vocês se sentem em relação a isso?
Amílcar: É um grande prazer, um grande privilégio. Acho que esse é um dos presentes dos deuses do rock pra nos recompensar por todo o nosso esforço.
Vitor: Em 2009 já tivemos o grande prazer de excursionar com o EXODUS e com o OVERKILL, o que foi animal e acabou culminando em conhecermos pessoalmente o Max Cavalera, com o SOULFLY. Agora no Wacken em 2011, tocar com o SEPULTURA vai ser legal demais! Não só por serem ótimas pessoas e músicos, mas por serem ídolos mesmo. Só temos a agradecer!
André: É uma honra estar lá junto com os caras que inspiraram toda uma geração por sempre ter uma visão adiante da época.
Quais são os planos futuros da banda?
Amílcar: A idéia é começar a turnê do "AEquilibrium" no Brasil, ir para a Europa e fazer o máximo de shows possível a partir de julho, e depois voltar para cá. Ainda não dá para pensar em outro continente, pois exige uma estrutura maior e bem trabalhada. Por isso vamos apenas onde sentimos que vai haver um retorno legal. Mas é claro que quando surgirem propostas de produtores, agências e até mesmo da Wacken Records, para fazer uma turnê nos Estados Unidos, por exemplo, e nós sentirmos que vai rolar uma estrutura bacana, nós vamos!
Vitor: Isso mesmo. Não somos de dar o passo maior que a perna. Sempre vemos o que vai ser melhor pra gente.
Aproveitando o gancho nesse assunto de shows, eu gostaria de fazer uma pergunta como fã mesmo. Eu acredito que vocês chegaram em um patamar onde conseguiram acumular um grande número de clássicos. Assim como toda grande banda, chega uma hora que fica difícil montar um set list sem deixar de fora um som que a galera considere indispensável. Como vocês fazem na hora de montar o repertório para os shows?
Castor: Essa é a parte mais complicada! (risos) A gente sempre busca dar prioridade ao lançamento atual e para isso, algumas músicas dos discos antigos vão ter que sair. E é com muita dor no coração que a gente tem que tirar algumas músicas do set, mas também temos que pensar que se essa ficar, teremos que tirar uma do novo play, que precisa ser divulgado. Mas a gente sempre chega num resultado final que a gente sente que o show inteiro vai ter uma vibe legal para o headbanger, para ele pensar ‘poxa, não tocou tal música, mas mesmo assim o show foi legal pra caramba’. Pensamos em tudo: nas emendas de uma música pra outra, nas músicas que se encaixam melhor no meio ou no fim do set...
Amílcar: É claro que priorizamos o disco novo, mas tentamos sempre pegar pelo menos uma música de cada álbum. Mas, no fim das contas, sempre acabamos sacrificando um som ou outro, é natural.
Mas eu acho legal vocês terem essa preocupação em distribuir legal as músicas do set entre os discos. O HYPOCRISY, por exemplo, dessa vez que veio no Brasil, não tocou nenhuma do "Penetralia". O MANOWAR, então, nem se fala... (risos) Claro que sabemos que não tem jeito de colocar tudo no set, mas machuca quando falta algum clássico absoluto!
Amílcar: É! Se bem que a gente não pode falar nada, porque de um bom tempo pra cá a gente não tem tocado nada do nosso primeiro álbum, "Shivering". Tocamos a "A Soul in Hell" por bastante tempo, mas paramos.
Castor: Mas é que depende também do clima do set, né? Às vezes uma determinada música no repertório pode meio que quebrar o clima que o show vem seguindo. Pensamos muito nisso também, é difícil.
Vitor: Senão teríamos que fazer como o RUSH, que toca três horas de set ao vivo! (risos)
Castor: Aqui no Brasil ainda é mais fácil porque nossos shows sempre duram entre uma hora e quinze, uma hora e meia. Agora lá fora, as apresentações costumam durar entre quarenta minutos e uma hora! Daí tem que tirar música MESMO, não tem jeito! (risos)
Amílcar: Eu lembro que na época do Asylum of Shadows tinha música que a gente tocava e falava que ela nunca ia sair do set, mas no disco seguinte ela já não era mais tocada ao vivo. (risos) Mas isso é normal, acontece. Acabam vindo músicas que você gosta mais de tocar e que são mais interessantes de mostrar ao vivo pros fãs.
Vitor: Mas no fim das contas, é divertido!
Amílcar: Isso mesmo, é um problema divertido! (risos)
Castor: Tem muita música do "Pandemonium" que eu amo tocar, como a "World of Misery" e a "Leather Apron", mas chega uma hora que não tem como elas entrarem mais no set.
Vitor: Tem também a "The Fall of Men", do "Hellbound"!
Amilcar: Uma que eu adorava tocar era a "Finally the Disgrace Reigns", do "Asylum"!
Vitor: E a "Under the Wings of the Empire", que sempre tem um louco gritando por ela entre uma música e outra nos shows? "Toca Under the Wings!" (risos)
Amílcar: Ela está virando o nosso ‘Toca Raul!’ (risos)
Agora, a pergunta para finalizar. Eu, como fã, headbanger e musicista, vejo vocês conquistando, pouco a pouco, os sonhos que todo headbanger gostaria de um dia alcançar. Para muitos de nós, vocês já estão vivendo um sonho. Vocês acham que já chegaram nesse ponto de olhar para a carreira de vocês e afirmar ‘Sim, realmente estamos vivendo o nosso sonho!”?
Castor: Acredito que ainda não! Ainda falta um pouco! Tudo isso que vem acontecendo, como tocar no Wacken, nada mais é do que uma recompensa por todo o nosso esforço e trabalho. Com o tempo, isso vem naturalmente. É claro que o que conquistamos até agora é muito gratificante e é sim o que sempre sonhamos, mas ainda faltam algumas coisas para acontecer, coisas que planejamos e que ainda não rolaram!
André: Pra mim está sendo incrível, mas sempre ainda há coisas para buscar. Estar com os caras agora é uma coisa que me dá muito prazer e orgulho, mas isso é apenas o começo de muita coisa que está por vir. Espero poder ajudar a levar esse trabalho a um lugar mais alto, até para retribuir o carinho que os fãs já têm me dado.
Amílcar: Com certeza somos muito gratos a tudo o que aconteceu pra banda, mesmo porque a gente buscou isso! Mas o que acontece é que a gente sempre busca mais. Não é uma questão de ser ambicioso, de querer tudo. Mas é que, por exemplo, a gente acaba de fazer uma turnê com o EXODUS e o OVERKILL, já pensando ‘Imagina então fazer uma turnê com o SLAYER?’. Se nós, uma banda que veio do nada como todas as outras, conseguimos estar ali no meio do Gary Holt e do Bobby Blitz, por que um dia não podemos estar com o METALLICA, por exemplo? Tocamos no Wacken? Sim, mas e se um dia rolasse o Monsters of Rock? Nada é impossível!

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