Analisando por partes, começamos no aspecto externo: caixinha e encarte simples, mas bonitos e completos, com o set list e ficha técnica. Tudo ok.
Agora, falando sobre as filmagens e a edição. O show infelizmente está em fullscreen (tela cheia), mas nada que incomode o espectador. Quando começa a apresentação em si, surge a dúvida: qual o sentido do timecode no canto inferior esquerdo da tela? Opção estética? Bem, o fato é que não acrescentou nada às imagens.
O som, meus amigos, é simplesmente perfeito. Tudo bastante cristalino e pesado, muito pesado. As imagens também são muito bonitas e bastante coloridas (o sistema de iluminação do palco funcionou muito bem). Entretanto, a câmera do fundo parece de qualidade inferior e destoa das outras, com uma imagem mais escurecida e parecendo fora de foco. Não falaria se não incomodasse. Mas é algo que se pode relevar.
Em relação à edição em si, é bastante tradicional, sem frescuras ou glamour. E em se tratando de RDP, por que precisaria? É só no corte seco e boa! As câmeras se movem constantemente, mas nada de ousadia. Um feijão com arroz que funciona, e muito bem. As imagens da grua se alternam entre colorida e preto e branco. Entretanto os efeitos de vídeo antigo nas partes PB (riscos na “película”) são desnecessários. Só detalhe.
Pois vamos à apresentação! Para começar, o esquema de emendar uma música após outra é uma grande sacada que dá muita força e dinâmica ao show. Entre os exemplos, podemos citar “Expresso da Escravidão” e “Poluição Atômica” na sequência, em que não há espaço para respirar. Muito bom.
Outro aspecto interessante notado é que em palcos pequenos, a RDP se adapta melhor. A relação próxima com os fãs fica muito mais intensa, é só ver os inúmeros stage dives, principalmente no início da apresentação.
Quanto à performance, simplesmente animal. Boka continua criativo e impecável, talvez o melhor baterista brasileiro de hardcore. Juninho com seus saltos quase acrobáticos são um show à parte. Por trás dos óculos, o carismático Jão detona na guitarra, com seus grandes e ótimos riffs, sem nunca esquecer o peso de seu instrumento. E João Gordo... bom, é o Gordo, então, vocês já devem saber o que esperar, certo? Enfim, todos sujos e agressivos (não, os adjetivos citados não são mera coincidência). Tocam com uma energia fora do normal. Muito intenso.
O legal de se assistir à banda ao vivo é admirar o jeito descompromissado com que tocam, soando bastante espontâneo, como se não dessem importância às câmeras que filmam o show. Ótima atitude. Gordo não faz questão de ser inteligível (nem nunca fez). Ele só extravasa, como um show desses “pede”. Muito legal.
E o repertório, meus amigos! Abrange todas as fases da carreira. Obviamente não deixaram de fora grandes hinos, como “Sofrer”, “Beber até Morrer”, “Crucificados pelo Sistema” ou “AIDS, Pop, Repressão” – esta exigida pelo público e prontamente atendida. Só que a RDP foi além. Os caras tocaram material inesperado, uma ótima surpresa para quem assiste ao DVD. Músicas como “Morte ao Rei”, e “Mad Society”, mesmo que incompletas, surpreenderam. Juntamente com elas, vieram as boas “Bad Trip” e a ácida “Suposicollor” (ambas do “Just Another Crime... In Massacreland” – um álbum injustiçado do grupo), relembrando os tempos de nosso antigo ex-presidente Fernandinho. Mortais!
“Descanse em Paz” ficou maravilhosa ao vivo, arrepiante. “Covardia de Plantão” é violentíssima, atordoante e avassaladora. “Morrer” é outra música fodida ao vivo! Curta, mas suficiente para destruir tudo! “Amazônica Nunca Mais” é perfeita! Muito empolgante. E na sequência, “Plano Furado II”, fenomenal. Destaque para a bela chuva de ranho que Gordo expele pelo nariz. Uma beleza. E até uma pincelada na hilária “Gil Goma” eles dão, para depois executarem a ótima “Farsa Nacionalista”. Sensacional.
Chegando ao final, como de costume, Jão deixa sua guitarra de frente para o amplificador, gerando aquela microfonia ensurdecedora, mas logo retornam para o bis com três clássicos: “Crianças Sem Futuro” (linda), “Velhus Decréptus” e terminam com “Crise Geral”. Aí, você pensa: “por que eu não estava lá? Por que não participei de um registro dessa importância? O quê? Já acabou???? Passou rápido demais!”. Lamentável.
No único extra do disco, fazem uma espécie de auto-entrevista com inserts em que falam de suas apresentações no local. Interessante o fato de ser um vídeo bem caseiro, despretensioso, com cortes mostrados sem preocupação. É apenas um registro simples, mas muito válido. Curiosidade: quando falam de uma história que envolve Jello Biafra (ex-Dead Kennedys), ficam imitando o cantor dizendo: “Who did this shit? You!”. Para quem não se lembra, as frases foram usadas no finalzinho da música “Breaking All the Rules” (cover de Peter Frampton), do álbum “Just Another Crime... In Massacreland”. Pronto, uma dúvida que assolava a humanidade agora é respondida!
“Ao Vivo no Circo Voador” é um registro mais do que merecido de uma das maiores bandas do Brasil. Demorou 25 anos para acontecer! É ótimo ver como esses caras chegaram aonde estão, passando por todas as dificuldades que passaram. É contraditório, mas o Ratos de Porão é a banda underground mais conhecida do país. Vendo os caras tocarem, parece mesmo amor à música.
Assim como “Guidable”, esse DVD aqui também é fundamental não só para fãs do RDP ou mesmo de hardcore/crossover em geral, mas para quem gosta de rock pesado, independentemente do sub-gênero!
1- Intro
2- Pedofilia Santa
3- Engrenagem
4- Expresso da Escravidão - Poluição Atômica
5- Toma Troxa
6- Arranca Toco
7- Agressão Repressão
8- Descanse em Paz
9- Não Me Importo
10- Crucificados pelo Sistema
11- Pobreza - Caos
12- Bad Trip
13- Coverdia de Plantão
14- MEDLEY 1: Morte ao Rei - Anarkophobia - Mad Society
15- Problemão
16- Morrer - Sofrer
17 - AIDS, Pop, Repressão
18- Beber até Morrer
19- Crocodila - Bico do Corvo
20- Suposicollor
21- Amazônia Nunca Mais - Plano Furado II
22- MEDLEY 2: Tatoo Maniac - Lei do Silêncio - Gil Goma - Ignorância - Farsa Nacionalista
23- Crianças Sem Futuro
24- Velhus Decréptus
25 - Crise Geral
Ratos de Porão – Ao Vivo no Circo Voador
Monstro Discos – 2010 – Brasil