28 de dezembro de 2010

A História do Burzum: Parte I - As Origens e os Significados


Esta é uma tradução da biografia do Burzum, em nove partes, publicada originalmente no site da banda, e redigida pelo próprio Varg Vikernes. Varg é um assassino confesso, defensor da supremacia branca e possivelmente um incendiador de igrejas. O texto foi traduzido em sua totalidade, e não expressa a opinião do tradutor, nem do site Whiplash!, nem de nenhum outro senão a do próprio autor, Varg Vikernes.
Como este é um website do Burzum, acredito que Você tenha um certo interesse pelo Burzum, então contarei a Você algumas coisas sobre o Burzum que nunca foram ditas antes. Todas as bandas têm uma origem, um começo e uma razão de existir. Então começarei dizendo a você por que o Burzum surgiu e também por que terminou da maneira que terminou.


Uruk-Hai (por John Howe)
Uruk-Hai (por John Howe)


Em 1988 ou 1989, quando já estava tocando guitarra havia um ou dois anos, fundei uma banda chamada Kalashnikov, juntamente com dois outros caras. Nós batizamos a banda de Kalashnikov porque, entre outras coisas, esse era o nome de meu fuzil de assalto favorito. Eu costumava jogar RPGs (Role-Playing Games) e, quando estávamos jogando "Twilight 2000", eu sempre equipava meu personagem com uma AK-47 (Avtomat-Kalashnikov 47). Mas eu também jogava RPGs estilo fantasia, como AD&D ("Advanced Dungeons And Dragons") e MERP ("Middle-Earth Role-Playing") com regras GM ("Game Master"), então eu fui muito influenciado pelo fantástico mundo da Terra-Média. Por causa disso, uma de nossas músicas foi chamada de "Uruk-Hai" e logo mudamos o nome da própria banda para Uruk-Hai. Não me lembro da letra daquela música, mas não acho que era muito profunda ou avançada (o refrão era: "Uruk-Hai! You will die" [N.: “Você vai morrer”] , ou algo parecido...). "Uruk-Hai" é, como a maior parte dos fãs de Burzum devem saber, o nome dos "High-Orcs" de Sauron, e sua tradução é "Raça dos Orcs", e vem da Língua Negra, o idioma de Mordor.

Na minha interpretação de adolescente eu sempre via os Hobbits como crianças ou simplesmente personagens maçantes. Os anões me lembravam porcos capitalistas gananciosos e eram também muito maçantes. Suas regras eram legais e Moria era um lugar maravilhoso, mas eu odiava a ganância deles – e, além de tudo isso, quem é que deseja ser pequeno? Os elfos eram fascinantes, belos e, principalmente, sua imortalidade e proximidade da natureza eram características interessantes, mas eles eram um pouco burros e lutavam pelo lado errado. Então eu senti uma atração natural por Sauron, que era a pessoa que, antes de tudo, dava ao mundo aventura, adversidade e desafios. Seu Olho, seu Anel e a torre de Barad-Dur são atributos similares aos de Odin [N.: Deus dos deuses na mitologia nórdica]. O Olho de Sauron era como o Olho de Odin, o Anel de Sauron era como o Anel de Odin, Draupnir ("O Emissor"), e Barad-Dur era como o trono de Odin, chamado Hliðskjálf ("Local de Rituais Secretos"). Seus Uruk-Hai e Olog-Hai ("Raça dos Trolls") eram como guerreiros vikings, os Warges eram como lobisomens criados por Odin, e assim por diante. Eu podia me identificar facilmente com a fúria das “forças das trevas” e me satisfazia com a sua existência, porque eles tornavam um mundo pacífico e chato mais perigoso e interessante.
O olho de Sauron (por John Howe)
O olho de Sauron (por John Howe)


Eu cresci lendo tradicionais contos de fadas escandinavos, nos quais deuses pagãos eram apresentados como criaturas “malignas”, como "trolls" e "goblins", e todos sabemos como a Inquisição transformou Freyr (Cernunnos/Dionísio/Baco et cetera) [N.: Deuses associados à fertilidade e aos prazeres] em "Satã". Tolkien não foi melhor do que eles. Ele transformou Odin, Sauron e meus ancestrais pagãos nos guerreiros Uruk-Hai. Para mim, as “forças das trevas” atacando Gondor eram como os Vikings atacando a França cristã de Carlos Magno, as “forças das trevas” atacando Rohan eram como os Vikings atacando a Inglaterra cristã. E devo acrescentar que os vikings acabaram perdendo essas batalhas, assim como Sauron e os orcs – não me importo em apoiar o lado derrotado. Eu sempre acreditei que deveria fazer o que achava certo, apesar das conseqüências e, se eu estivesse lutando por uma causa perdida, isso não me importava. Eu prefiro morrer lutando pelo que acredito a viver por qualquer outra causa.

Entretanto, ele não usou apenas a língua dos vikings e as línguas nórdicas para criar os orcs e seu idioma. A palavra "Orc" é, na verdade, o nome de uma tribo que viveu na Escócia em tempos remotos, nas Ilhas Orkney (também conhecidas como Órcadas). "Orc" é uma palavra do idioma gaélico que, até onde sei, significa "javali". Os cultos guerreiros das tribos nativas das Ilhas Britânicas provavelmente usaram javalis da mesma forma que os cultos guerreiros escandinavos dos “berserks” [N.: Algo como guerreiros implacáveis] e dos lobisomens usavam javalis e lobos. Os "Orcs" eram parte de um grupo de tribos conhecido desde a era romana até a época dos vikings como Pictos ("Aqueles que se pintam").
J. R. R. Tolkien
J. R. R. Tolkien


Portanto não chega a surpreender que um inglês católico como Tolkien tivesse usado, entre outros, “Bárbaros escoceses loucos, ruivos e que brandiam pesadas espadas” e “‘berserkers’ escandinavos furiosos, que queimavam igrejas” como modelos para alguns de seus vilões e, por causa disso, eu me senti mais atraído para esses vilões do que para os mocinhos. Eu tinha pouco em comum com personagens “cristãos”, como os cavaleiros “ingleses” de Rohan ou o povo “francês” de Gondor. Eu tinha pouca admiração por um “santo” como Aragon. Mesmo os elfos eram como estrangeiros, já que Tolkien usou o finlandês quando criou a língua deles e usou os finlandeses como modelo quando os criou. Eles realmente têm muito em comum com os Elfos, já que vivem no que é basicamente uma grande floresta (Finlândia), a leste das montanhas escandinavas (“As Montanhas Cinzentas”). Antes eles viviam no norte da Rússia, na vasta floresta ("Myrkwood", [Negra]) a oeste dos montes Urais. Eles também têm boa aparência (são loiros) e, como os elfos, são um pouco quietos, melancólicos, diferentes e distantes. Misteriosos, por assim dizer. Para mim, a linguagem dos elfos soa estrangeira e incompreensível – assim como o finlandês é incompreensível – enquanto o idioma dos orcs e a Língua Negra obviamente foram baseados no idioma de meus ancestrais. Então Uruk-Hai foi uma escolha lógica para o nome da banda.

O baterista e o baixista do Uruk-Hai eram pessoas que encontrei mais ou menos por coincidência. Eu já tinha encontrado o baterista antes, quando tínhamos (mais ou menos) uns 12-15 anos e ele apontou um revólver Magnum .375 carregado para minha testa na noite de Reveillon, porque ele achava que eu havia chamado ele de “gorducho” (uma ótima desculpa para apontar uma arma para a cabeça de alguém, é claro...). Eu não tinha chamado ele, e sim seu amigo, de “gorducho” e contei pra ele – e foi isso o que aconteceu. “Hm, okay”, ele disse, e saiu sem mais problemas (há, há). Seu interesse em tocar música era, eu acho o “normal” – ou seja, ter “sexo, droga e rock’n’roll”. O outro cara do Uruk-Hai tocava baixo só pra dar umas transadas – ele era, em outras palavras, um "rock'n'roller" estereotípico. O ideal seria que ele tivesse tocado guitarra, já que os guitarristas são, por alguma razão bizarra, mais populares com as garotas, mas ele nem conseguia tocar o baixo, então...
Em 1989 encontrei os caras do Old Funeral, que eram músicos excelentes e sérios, e abandonamos o projeto Uruk-Hai. Os outros dois membros do Uruk-Hai já estavam brigando por uma garota e, por isso, paramos de ensaiar, então não foi difícil acabar com o Uruk-Hai. Eu toquei com o Old Funeral por dois anos e, nessa época, o Old Funeral deixou de ser uma banda Techno-Thrash bem legal e virou uma banda de Death Metal chata. Isso não foi minha culpa, porque eles já tinham mudado do Techno-Thrash pro Death Metal quando me juntei a eles. Essa foi a razão pela qual deixei o Old Funeral, já que eu queria tocar meu próprio tipo de música, algo mais original e pessoal do que aquilo que tocávamos no Old Funeral naquela época (1989-1991).
(Você deve ter notado como o nome era idiota: Old Funeral. Mas, a favor deles, devo dizer que acho que eles se chamavam originalmente apenas Funeral. Então descobriram que outra banda também se chamava Funeral, mas eles já tinham usado aquele nome antes da outra banda Funeral, então eles mudaram para Old Funeral. Eles eram, em outras palavras "the old Funeral" [N.: o “velho” Funeral], e não Old Funeral, então o nome não é tão idiota como parece à primeira vista).
Ao invés de reiniciar o projeto Uruk-Hai, eu mudei o nome e decidi fazer tudo sozinho, embora tenha usado alguns riffs do Uruk-Hai. Eu não queria tocar ao vivo e meus motivos para tocar música eram bem diferentes da tradicional motivação “rock’n’roll”. Enquanto tocava no Old Funeral eu mantive meu interesse por RPGs e ainda era muito influenciado pela magia da fantasia. Acho que já disse antes que o conceito doBURZUM baseava-se o ocultismo, mas o mais correto a dizer é que se tratava de um conceito mágico, ou um conceito construído sobre a magia fantástica. Tudo que se referia ao BURZUM não era deste mundo, até o nome.
O anel de Sauron (por John Howe)
O anel de Sauron (por John Howe)


Como eu disse antes, quando os cristãos chamaram os deuses de meus ancestrais de “demônios”, "trolls", "goblins" e tudo o que era considerado “maligno”, eu naturalmente me senti atraído por tudo que era visto como “maligno” pelos cristãos. Essa é uma reação um pouco imatura, talvez, mas eu era adolescente, então não via problema algum. Eu ainda tinha essa atitude em 1991, e Uruk-Hai era um excelente nome, mas eu sentia que estava começando tudo de novo, então eu precisava também de um novo nome. Como a grande parte dos fãs de Tolkien deve saber, "burzum" é uma das palavras que estão escritas em Língua Negra no Anel de Sauron. Se bem me lembro, a última sentença é "ash nazg durbabatuluk agh burzum ishi krimpatul", que significa "um anel para atrair todos eles e uni-los através da escuridão". A “escuridão” dos cristãos era, claro, minha “luz”. Portanto, para mim foi natural usar o nome Burzum.

Muitas bandas (exceto Old Funeral, é claro) tinham nomes ingleses “maneiros”, como Immortal, Mayhem, Darkthrone, Destruction, Celtic Frost, Enslaved, Pestilence, Paradise Lost, Morbid Angel, Death, e assim por diante. Eu não queria isso e essa foi uma das razões que me levaram a escolher os nomes Uruk-Hai e depois BURZUM. Naquela época – antes do lançamento dos filmes da série “Senhor dos Anéis” dirigidos por Peter Jackson – seu significado era praticamente solis sacerdotibus: só os iniciados, por assim dizer, sabiam o que significava. Somente pessoas que tinham um interesse especial no mundo de Tolkien sabiam, e isso era legal – era assim que eu pensava. Isso permitia que os ouvintes se sentissem especiais e percebessem que BURZUM era feito especialmente para eles (e era).
A idéia por trás do Burzum não era somente fazer música original e pessoal, mas também criar algo novo – um pouco de “escuridão” num mundo “luminoso”, seguro e maçante demais. Diferentemente de 99% de todos os músicos, eu não tocava música para me tornar famoso, ganhar dinheiro e dar umas transadas. Eu não tinha interesse em fama ou dinheiro e minha visão sobre as mulheres era muito ingênua e romântica, uma visão quase medieval (ou de um mundo de fantasia) sobre as mulheres, então eu não tinha nada além de desprezo pela atitude estúpida “sexo, DROGAS e rock’n’roll” do resto do pessoal do metal. Ao invés disso, minha motivação era um desejo de experimentar a magia e tentar criar uma realidade alternativa usando a “magia”. Se o poder espiritual de muitas pessoas pode ser “reunido” em um pote, ou transferido através de um objeto ou ser mágico (em norueguês chamamos isso de fylgja ["seguidor", "espírito guardião"]), ele poderia ser usado para criar algo real. Isso é um pensamento puramente mágico e, ao invés de ser baseado em ocultismo é baseado em magia e fantasia – e isso é algo sobre o qual é interessante pensar. Burzum foi criado para ser esse pote, a arma mágica (ou se Você preferir, o anel mágico), por assim dizer. Devo enfatizar (no caso de Você pensar que acabei de descrever tudo que se passava em minha mente) que esse era um projeto experimental que tomava apenas parte de meu tempo, já que eu também fazia outras coisas na vida (como me preparar para uma guerra de guerrilha no caso de uma invasão da Noruega pelos EUA...).
Varg adolescente
Varg adolescente

Varg, em 1992
Varg, em 1992


Se as pessoas soubessem que o Burzum era apenas a banda de um adolescente, isso poderia arruinar a magia e, por essa razão, eu achei que precisava permanecer anônimo. Então eu adotei um pseudônimo, Count Grishnackh, e usei uma foto minha que não parecia nem um pouco comigo no álbum de estréia, para fazer o Burzum parecer mais estranho e confundir as pessoas. E devo acrescentar que a entrevista que gerou todas aquelas manchetes em janeiro de 1993 também foi feita anonimamente e nunca deixei jornal algum usar meu nome ou minhas fotos até tempos depois, quando já era tarde demais para permanecer anônimo. Não era minha intenção tornar-me famoso (ou “infame”...) e, até quando usaram meu nome verdadeiro na época, Kristian (do grego "Kristos", que significa "Cristo") Vikernes, ao invés de meu pseudônimo, fiquei horrorizado – e isso foi o que realmente pesou na balança e me fez mudar meu nome legalmente. Eu nunca deixaria a magia do Burzum ser “arruinada” por algo assim...

Então quando arruinaram minha condição de anônimo eu tive que abandonar essa idéia e parei de usar o pseudônimo. Eu queria que o BURZUM fosse famoso, não eu, mas isso obviamente não funcionou do jeito que eu havia planejado.
Como as pessoas envolvidas com o assunto já sabem, magia é tudo relacionado a imaginação, simbolismo, visualização e força de vontade. Se Você imaginar algo acontecendo em Sua mente, Você fará tal coisa acontecer – isso é, se a Sua força de vontade for suficientemente forte ou se Você possuir “poder espiritual” suficiente. Se um objeto simboliza um certo poder, ele se torna tal poder. É por isso que nossos antepassados entalharam runas em rochas e pedaços de madeira, porque as runas simbolizavam certos poderes. Isso também explica porque os solstícios [N.: 21 ou 23 de junho (solstício de inverno no hemisfério sul e de verão, no hemisfério norte)] e os equinócios [N.: Momento em que o Sol, em seu movimento anual aparente, corta o equador celeste, fazendo com que o dia e a noite tenham igual duração. Ocorre em 20 ou 21 de março e 22 ou 23 de setembro] de inverno e de verão são tão importantes, porque eles simbolizam eventos especiais, que são descritos em nossa mitologia. E é por isso também que começamos a usar bijuterias, porque os diferentes metais e pedras simbolizavam diferentes poderes no universo.
Burzum deveria ser tal símbolo. BURZUM era uma tentativa de criar (ou “recriar”, se Você preferir) um passado imaginário, um mundo de fantasia – que, por sua vez, era baseado em nosso passado Pagão. O próprio BURZUM era um feitiço. As músicas eram como feitiços e os álbuns eram elaborados de maneira especial, para fazer os feitiços funcionarem. O BURZUM não foi concebido para shows ao vivo e sim para ser escutado à noite, quando os raios de sol não podiam vaporizar o poder da magia e quando o ouvinte estivesse sozinho – de preferência em sua cama, prestes a dormir. Os primeiros dois álbuns foram feitos para o formato LP, o que significa que cada lado é um feitiço, portanto eles não funcionam em CD, a menos que você programe o CD player para tocar somente as faixas de um lado do LP de cada vez. Já os últimos álbuns foram criados para CD, portanto eles não funcionam tão bem em LP. A primeira faixa serve para acalmar ou “preparar” o(a) ouvinte e torná-lo(a) mais suscetível à magia, as músicas seguintes levam o(a) ouvinte à exaustão e colocam-no(a) em um estado de transe e a última faixa “acalma” o(a) ouvinte e leva-o(a) para o “mundo de fantasia” – quando ele ou ela adormeceria. Esse era o feitiço, a magia que tornaria o passado imaginário, o mundo de fantasia, real (na mente do(a) ouvinte). Se Você analisar os álbuns do BURZUM e como eles são feitos, Você entenderá o que quero dizer. A última faixa do “feitiço” (no lado do LP ou no CD) é sempre uma faixa calma (muitas vezes de sintetizador). Se isso funciona ou não é, obviamente, outra questão, mas essa era a idéia.
The Temple Of Elemental Evil
The Temple Of Elemental Evil

Burzum - 1992
Burzum - 1992

Det Som Engang Var - 1993
Det Som Engang Var - 1993

Hvis Lyset Tar Oss - 1994
Hvis Lyset Tar Oss - 1994

Filosofem - 1996
Filosofem - 1996


A arte gráfica dos dois primeiros álbuns foi inspirada por um módulo do AD&D (1ª edição) chamado "The Temple Of Elemental Evil", e as artes gráficas do terceiro e do quarto álbum foram inspiradas por tradicionais contos de fada escandinavos. Eu nunca cheguei a ler livro algum sobre Satanismo, então aqueles que acreditam que fui influenciado pelo Satanismo estão simplesmente enganados. Embora eu tenha dito que era satanista durante um curto período de 1992, eu nunca fui um satanista. Na verdade, apenas usei o termo para provocar as pessoas e marcar minha hostilidade com relação ao Cristianismo – e enfatizar a necessidade de “escuridão” no mundo (já que “luz” demais não ilumina nossos caminhos e nos aquece e sim cega nossos olhos e nos queima – conforme foi claramente dito nos álbuns "Hvis Lyset Tar Oss" e "Filosofem" [Se Você quiser saber mais sobre essa filosofia, sugiro que leia meus artigos ou livros sobre Paganismo]).

O que me inspirou a compor a música em si também é um tanto estranho. Quando eu era adolescente, meus amigos de RPG e eu algumas vezes pegávamos bastões de madeira, lanças e espadas e íamos para o campo lutar entre nós. Não tínhamos nenhum outro motivo para lutar além da diversão e ninguém tentava machucar ninguém. Nós nunca tentávamos atingir a cabeça de nossos oponentes ou outras áreas “vulneráveis” (onde se localiza o “cérebro” do homem...) e não usávamos muita força. Mesmo assim nós nos machucávamos por acidente e a luta nunca parava até que pelo menos um de nós sangrasse, quase sempre nos dedos ou punhos, ou que um de nós achasse que já tinha sentido dor demais por um dia.
Nós lutávamos principalmente em três lugares: Um era na floresta, perto de um velho e isolado cemitério para vítimas da lepra, da gripe espanhola ou da Peste Negra, não me lembro exatamente. A floresta era bem fechada e o terreno era acidentado, então nós freqüentemente caíamos, ou rolávamos, pelas encostas de pequenos montes, pelos arbustos e caíamos em árvores apodrecidas – enquanto tentávamos evitar os golpes de nossos oponentes.
O outro lugar era uma colina arborizada com um antigo horg (um monumento de pedra pagão) a cinco minutos a nordeste de onde eu fui criado. Era uma floresta decídua [N.: que mudava conforme a estação], então era muito diferente da outra floresta (de pinheiros) na qual costumávamos lutar, e era um local fascinante. É claro que trazer armas para um local sagrado e lutar nele não é, teoricamente, uma coisa boa, de acordo com as antigas tradições, mas as armas eram feitas de madeira e não tinham sido feitas para machucar pessoas, então aquilo não era algo muito sério (elas estavam mais para varinhas de mágicos do que para outra coisa).
O terceiro “campo de batalha” eram as ruínas de um velho monastério que ficava a uns três ou quatro minutos a sudoeste do local onde o pessoal do Immortal foi criado. O monastério foi incendiado pelos vikings no séc. VIII, pelo que me lembro. A propósito, aquele foi o primeiro monastério construído na Noruega – e não chega a ser nenhuma surpresa que sua existência como monastério tenha sido curta. Os monges (provavelmente britânicos) foram esquartejados ou jogados em um pântano nos arredores para se afogarem.
Era sempre muito bom voltar pra casa e tomar um banho quente depois dessas lutas: suados, encharcados, com hematomas, sempre sangrando e com espinhos ou folhas de pinheiro em nossas roupas (e até no cabelo). Eu me sentia como se tivesse voltado pra casa depois de uma batalha real. Exausto – e me sentindo vivo.
Entretanto, as pessoas que viviam no local reagiam um pouco à nossa presença. Uma vez eu pulei de um arbusto – depois de esperar para emboscar os outros caras – e surpreendi uma família que estava apenas caminhando. Meu cabelo era longo e tinha alguns pedaços de musgo e espinhos de pinheiro, eu estava usando roupas escuras com temática Death Metal e ainda tinha um bastão nas mãos, então eles não ficaram muito contentes em me ver. Devido ao risco de encontrar gente “normal” desfrutando da liberdade da Mãe Natureza, fomos forçados a lutar quando o risco de encontrar gente “normal” fosse mínimo. Em outras palavras, esperávamos até tarde da noite. Nós às vezes trazíamos tochas ou acendíamos uma fogueira, para podermos ver na escuridão e também, é claro, as noites de verão escandinavas não chegam a ser muito escuras, e continuávamos lutando.
Inicialmente eu praticava esse jogo de luta com alguns amigos de RPG mas, quando encontrei os caras do Old Funeral (e do Amputation, depois Immortal), nos também começamos a fazer isso. Esse era um evento social para nós e durante os intervalos falávamos de música, alguns planejavam shows ao vivo e nós geralmente inspirávamos uns aos outros – antes de chegarmos em casa no meio da noite e tocarmos música!
(Devo acrescentar que, quando fui preso por matar Euronymous, essas lutas foram descritas como “rituais satânicos noturnos” pela mídia, só para dar a Você um exemplo de como eram ridículos e falsos os rumores e as acusações de “Satanismo” propagados pela mídia).
Varg (Count Grishnackh), em 1992
Varg (Count Grishnackh), em 1992


O clima da floresta, o clima da noite, o clima do antigo local sagrado, a dor dos hematomas e pequenos ferimentos, o gosto dos espinhos dos pinheiros, da terra e do sangue, e o cheiro da madeira queimando: Essa era a nossa (ou pelo menos a minha) inspiração. Sempre que voltava para casa, depois que já tinha passado dos 17 anos e troquei meu ciclomotor [N.: bicicleta dotada de motor] por um carro, eu tocava música bem alto no som do carro e sempre dava longos passeios pelos vales e florestas durante a noite, e através da cidade ou zonas rurais, antes de finalmente chegar em casa. O som monótono do motor do carro e a música alta eram hipnóticos e, é claro, eu era influenciado pelas endorfinas também, já que meu corpo estava lutando contra a dor dos hematomas e outros ferimentos. Essa era uma “escuridão” positiva em nosso mundo de “luz” – e isso me inspirou, além de me fazer sentir vivo.

Nesse primeiro período do BURZUM – entre 1991 e 1992 ou agosto de 1993 – eu praticamente compus toda a música de todos os álbuns. Os álbuns "Dauði Baldrs" e "Hliðskjálf" são, em sua maior parte, reconstruções de riffs esquecidos ou versões de sintetizador de velhos riffs de guitarra do BURZUM ou até mesmo velhas músicas não lançadas, então eles também foram feitos praticamente nesse período. De certa forma essa pode ser considerada a Era de Ouro doBURZUM – que teve seu fim esperado quando fui preso em agosto de 1993.
Paradise Lost
Paradise Lost

Bathory
Bathory

Old Funeral
Old Funeral

Celtic Frost
Celtic Frost

Destruction
Destruction

Kreator
Kreator

Dead Can Dance
Dead Can Dance


Na época em que comecei com o Burzum ainda não tinha ouvido falar do Venom, então logicamente o Burzum não foi – como alguns alegaram – influenciado pelo Venom, de forma alguma. Quando eu dirigia de volta para casa depois das lutas de “espada”, ouvindo música, eu costumava escutar uma fita demo do Paradise Lost, lançada em 1989 ou 1990 eu acho; "Hammerheart" e "Blood. Fire. Death”, do Bathory; a fita demo do Old Funeral, chamada "Abduction Of Limbs" (...); Pestilence (uma banda holandesa de Death Metal, pelo que me lembro) e algumas outras bandas underground de Death Metal que não me lembro hoje. Ouvia ainda house underground e techno (mas apenas quando estava sozinho, porque fãs de metal não parecem gostar desse tipo de música) e, é claro, eu ouvia Burzum. Os outros caras gostavam de Entombed e Morbid Angel, mas eu nunca gostei e nem ouvi. A propósito, ninguém ouvia Venom mas, no final de 1991, começamos a ouvir Celtic Frost e Destruction antigos, os primeiros do Kreator ("Pleasure To Kill" e "Endless Pain") e (também os primeiros) álbuns do Bathory que, a propósito, todos nós achávamos que era Thrash Metal. Entombed e outras porcarias do Death Metal que estavam na moda foram esquecidos por eles. Sei que os caras do Emperor ouviam Merciful Fate e King Diamond ao invés das, ou talvez além das, bandas que mencionei acima, coisas que eles escutavam nos anos 80, então não se pode sair por aí afirmando que alguém devia ouvir essa ou aquela banda. Escutávamos aquilo de que gostávamos. Em 1992 eu (e pelo menos um dos caras do Emperor) também começamos a escutar Dead Can Dance, "Within The Realm Of A Dying Sun" e outros sons desse tipo. Nós estávamos simplesmente cansados das hordas maçantes, modistas e repetitivas de bandas de Death Metal que produziam toneladas de álbuns ruins que soavam todos da mesma forma e voltamos a ouvir o que ouvíamos antes ou tentávamos encontrar outro tipo de música. É claro que continuei escutando bons lançamentos de Death Metal, como a demo do Paradise Lost que mencionei antes, e sei que os outros ouviam o "Altar Of Madness", do Morbid Angel, e Deicide (quando eles lançaram seu álbum de estréia, em 1992, eu acho).

“Drifting
In the Air
Above a Cold Lake
Is a Soul
From an Early
Better Age
Grasping for
A Mystic Thought
In Vain...but Who's to Know
Further on Lies Eternal Search
For Theories to Lift the Gate
Only Locks Are Made Stronger
And More Keys Lost as Logic Fades
In the Pool of Dreams the Water Darkens
For the Soul That's Tired of Search
As Years Pass by
The Aura Drops
As Less and Less
Feelings Touch
Stupidity
Has Won too Much
The Hopeless Soul Keeps Mating”.

“Movendo-se
No ar
Sobre um lago gélido
Há uma Alma
De velhos
E melhores tempos
Ansiando por
Um pensamento místico
Em vão... mas quem sabe
Adiante estará a busca eterna
Por teorias que abram o portal
Somente fechaduras são mais fortes
E mais chaves são perdidas quando a lógica desaparece
No lago de sonhos a água escurece
Porque a Alma está cansada de procurar
Os anos passam
A aura some
E cada vez menos
Os sentimentos tocam
A estupidez
Está dominando
A Alma desamparada continua procurando seu par”

Isso era, na verdade, tudo o que eu tinha pra dizer e as outras letras doBURZUM eram apenas comentários sobre esta. O último verso era "the hopeless soul keeps mating", mas na capa estava escrito erroneamente "the hopeless soul keeps waiting" [N.: “A Alma desamparada continua esperando”] devido a um erro de Euronymous, que administrava a gravadora (DSP) que lançou o álbum pela primeira vez. Aparentemente minha letra de mão era difícil de ler. Além disso, a música "Ea, Lord Of The Deeps" [N.: “Ea, Senhor do Abismo”] deveria ter sido intitulada "Ea, Lord Of The Depths" [N.: “Ea, Senhor das Profundezas”], mas obviamente Euronymous achou melhor mudá-la.
A magia era necessária somente porque eu não estava satisfeito com o mundo real. Não havia aventura, medo, trolls, dragões ou mortos-vivos. Não havia magia. Então percebi que eu mesmo precisava criar a magia. Porém, foi muito triste ver essa magia ser arruinada ou pelo menos enfraquecida em 1993, quando a mídia começou a escrever sobre ela, e ver muitas antigas bandas de country, rock e Death Metal da Noruega subitamente tingirem seus cabelos e começarem a usar “corpse-paint” e a tocar Black Metal; para ficarem famosas, ganharem dinheiro e darem umas transadas – e não para mudarem o mundo. Com certeza eles não se importavam com a magia, mas, em sua defesa, devo dizer que nunca mostraram muita magia para eles. A mídia distorceu demais as coisas, como sempre fazem. As novas bandas fizeram que o Black Metal se tornasse parte do mundo moderno, ao invés de uma revolta contra essa realidade, que é o que deveriam ter feito Talvez eles tenham se sentido atraídos porque a magia funcionou, porque se sentiram atraídos por algo que era especial. Eu não sei. Só sei que não gosto de ver no que isso tudo se transformou: somente uma outra subcultura do tipo “sexo, DROGAS e rock’n’roll” sem imaginação e que é parte do mundo moderno. Isso se tornou parte da política “pão e circo” dos opressores – tornou-se parte do problema.
Minha esperança era de que o BURZUM pudesse inspirar as pessoas a desejar uma nova e melhor realidade no mundo real e a fazer alguma coisa a respeito. Talvez se revoltar contra o mundo moderno, recusando-se a participar do estupro da Mãe Terra, recusando-se a participar do assassinato de nossa raça européia, recusando-se a se tornarem parte de alguma dessas subculturas “rock’n’roll” criadas pela mídia e construindo novas e saudáveis comunidades, onde a cultura Pagã – e a magia, se Você assim preferir – possa ser cultivada.
Obrigado pelo seu interesse no BURZUM.
Varg Vikernes
Dezembro de 2004
“A Europa não é um termo geográfico, e sim biológico”.

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