7 de setembro de 2011

KerecsenSólyom: entrevista com a banda da Hungria


A KerecsenSólyom foi formada em 2004 na cidade de Szeged na Hungria. Pode-se notar a forte influência folclórica e histórica da banda já mesmo no seu nome, Kerecsen Sólyom, que em português significa Falcão Sacre, era a ave utilizada pelos Hunos em suas caçadas e batalhas. As letras das músicas remetem aos contos e lendas dos antigos guerreiros Hunos.
Além da formação instrumental tradicional de qualquer banda de Heavy Metal, a KerecsenSólyom conta com instrumentos como a jaw’s harp, mandolin, tamborim, flauta e shamandrums, que são muito utilizados por grupos de música folclórica da região. A sonoridade de suas músicas é ora agressiva e pesada com vocais guturais ora épica, sinfônica e melodiosa, remetendo a hinos de guerras, contando tanto com cantos em coro quanto com bons solos de guitarra.
O primeiro álbum da banda, intitulado Aquileia Ostroma (o cercado de Aquileia) nasceu da combinação da autêntica música folclórica húngara, música erudita e o metal melódico. As entonações bélicas remetem a grandes batalhas dos lendários guerreiros hunos.
A essência épica e sinfônica é intensificada pelos instrumentos clássicos e folclóricos como hurdy-gurdy, gaita de fole, flauta, kobza, zurna, trompete, trombone e coral.
O colunista de Folk Metal da Radio Metal, Lucas Pirani, entrou em contato com o vocalista da banda, Görög András, e traz até os leitores esta entrevista exclusiva:
Imagem
Lucas – Olá Görög, primeiramente obrigado por ceder a entrevista. Conte-nos que fatores levaram vocês a formar uma banda de Symphonic Folk Metal que expressa o folclore e a história de sua região.
Görög – Obrigado, Lucas. Fico feliz que graças a você ainda mais pessoas conheçam nossa música. Esta é uma sensação ótima! Primeiramente, eu teria estabelecido minha própria banda há muito tempo. Eu sempre gostei muito de cantar, e quando eu comecei a ouvir Metal eu percebi que eu tinha que me tornar um vocalista. Eu quis tocar Folk Metal desde o início. A inspiração veio principalmente dos dois primeiros álbuns do Finntroll e do primeiro álbum do Ensiferum. Mas eu também soube imediatamente que eu tinha que fazer Metal baseado na tradição e na música folclórica húngara, o Folk Metal húngaro. Isso também foi importante para a minha concepção sobre tocar instrumentos folclóricos originais.
Este tipo de música se adequa bem as letras sobre nosso passado, logo, minhas letras falam sobre as antigas lendas húngaras e dos hunos. Muitas pessoas podem pensar que essas lendas antigas são apenas parte da história e literatura e elas não têm nada a dizer... Eu acho que esse não é o caso, essas histórias são muito relevantes e tem muito mais coisa a dizer do que parece em uma primeira escuta, e parece que hoje em dia são mais necessárias do que nunca. Essas lendas são parte de nossa herança cultural, elas nos transmitem um sistema de valores que é condenado à morte no mundo moderno... O passado devia ser parte de nossas vidas, já que nossas vidas são baseadas em nosso passado. É natural que a cultura de hoje floresça da cultura antiga, e uma não existe sem a outra. O uso da música folclórica também tem o papel de manter a antiga herança cultural viva. Então essa é a maneira que a música e as letras se conectam no mundo de KerecsenSólyom.
Lucas – Estive lendo sobre a banda e vi que uma fonte de inspiração para as letras é o livro Mondák könyve de István Komjáthy. Fale um pouco sobre essa fonte.
Görög – O título significa: “O Livro das Sagas”, o subtítulo quer dizer: “Sagas Hunas e Húngaras”, então isso explica tudo. O trabalho de István Komjáthy é na verdade uma versão muito agradável da Mitologia Húngara. A história é sobre o antigo povo húngaro, e se passa desde os tempos antigos até a época da colonização no século IX. Eu adoro as lendas antigas desde minha infância. Quando me dei conta de que queria tocar Folk Metal eu soube que tocaria sobre as Sagas Húngaras, e claro, em húngaro.
Entre outras coisas, esta é uma característica de nossa música. O álbum “The Siege of Aquileia” é um álbum conceitual. Cada faixa fala sobre uma grande batalha, direta ou indiretamente. Eu usei esse livro de lendas como inspiração, as 5 faixas do álbum contam histórias dos 5 principais capítulos do livro, desde um passado antigo até o tempo da colonização na Planície da Panônia na época da pré-conquista (século IX).
Lucas – Todas as letras do último álbum estão em sua língua nativa. Vocês não pretendem escrever algumas em inglês para os próximos álbuns?
Görög – Como eu mencionei na última questão, eu quis cantar em húngaro desde o começo. Acho que esse idioma combina melhor com nossa música, expressa melhor as histórias e soa melhor. Mas eu já pensei nisso, podemos tentar o inglês. Se isso funcionar, o próximo álbum será duplo, com as versões em húngaro e em inglês. Talvez você pudesse fazer uma votação com os leitores e ouvintes para saber se querem letras em inglês.
Lucas – Na música Hősök mulató mezeje vejo que vocês falam de uma “Grande Árvore”. Isso me lembrou de Yggdrasil da Mitologia Nórdica. Existe mesmo alguma semelhança nesses conceitos? O que representa a “Grande Árvore” no folclore da Hungria?
Görög – A música Hősök mulató mezeje (traduzindo literalmente quer dizer “Campo de Festa dos Heróis”) fala do paraíso dos heróis de guerra. Similar a Vallhala na mitologia nórdica. Nessa música a “Grande Árvore” aparece nos sonhos do personagem principal como um link entre o mundo do céu (paraíso) e o mundo da terra (terra média), uma conexão entre deus e as pessoas. Essa “Grande Árvore” é o elemento principal da cultura de muitas pessoas. Nós também a chamamos de “Árvore da Vida”, “Árvore Mundo” ou “Árvore Shaman”. Essa árvore é um dos motivos mais aparentes nos nossos contos e artes folclóricas, na maioria das vezes como um símbolo da eternidade. Ela é o eixo do mundo segundo a mitologia. Possui suas raízes nas profundezas, o tronco na esfera da terra e a copa na esfera do céu, então a árvore simboliza o link entre as unidades verticais do mundo, possibilitando uma comunicação entre o submundo a terra média e o céu. Portanto há um tipo de conexão entre nossa árvore e a Yggdrasil. Por outro lado, eu li sobre a relação da Hungria com a Escandinávia e Germânia e esse tipo de conexão não é 100% possível... Eu li até mesmo sobre a relação húngara com a cultura Inca e Maia também, que são muito interessantes. Claro que o meio acadêmico não aceita essas teorias... Elas são verdadeiras? Ninguém sabe.
Lucas – As músicas de KerecsenSólyom possuem uma instrumentação e efeitos sonoros muito ricos, o que pode ser notado claramente na música Aquilea Ostroma, quais aspectos levou vocês a escolherem os instrumentos utilizados?
Görög – Como eu havia dito, o uso de instrumentos folclóricos autênticos é muito importante para nós. Eu imaginei isso desde o começo. O som desses instrumentos dá uma personalidade a nossa música, e acredito que isso também tenha uma função de proteger nossa tradição. Nesse álbum há mais de 15 músicos convidados, não apenas músicos que tocam música folclórica, mas também um naipe de metais de orquestra e um pequeno coral. Eu quis passar um sentimento cinematográfico através disso, que os ouvintes se sentissem em outro mundo ao ouvirem.
Lucas – Uma música que gostei bastante é a Keve Ostora, ela possui sonoridade agressiva e épica ao mesmo tempo. Do que a música fala?
Görög – Obrigado. Fico feliz em saber que gostou... Nós tivemos muitos problemas com esta música no estúdio. É uma música difícil, inclusive para tocá-la ao vivo. Ela fala de uma grande batalha chamada a batalha de Tárnokvölgy. Os beligerantes eram os hunos, sob o comando do capitão Keve, e o exército romano no fim do século IV antes de cristo. A música não fala da batalha inteira, apenas sobre uma pequena história:
A filha (Ríka) e o general (Csillagok Látója, lit. “vidente das estrelas”) do capitão Keve foram capturados pelos romanos. O resgate deles é um dos episódios mais importantes da batalha de Tárnokvölgy. A atmosfera austera da música evoca a enorme tropa do capitão Keve.
Lucas – Quais os próximos shows? Há alguma turnê internacional em vista?
Görög  – Nós tocamos há pouco tempo no Metalfest Open Air Hungary. O show foi um grande sucesso! Nós também gravamos um DVD. Nós queremos que o segundo álbum tenha um DVD bônus, então estamos gravando alguns shows. A Folk Metal Night será na capital, Budapeste com as bandas Niburta, Elanor e Isatha. E também a Rockmaraton está por vir, um dos maiores festivais de Rock/Metal da Hungria, será uma grande festa!
Estamos pensando também em uma turnê internacional, gostaríamos de participar da Samhainfest no outono, junto com a Czech Cruadalach. Nós iríamos até mais longe, mesmo dentro da Europa, mas ainda não temos dinheiro suficiente para isso.
Lucas – Toda banda de Folk Metal acaba desempenhando um papel de propagar e difundir o folclore, a cultura e a história de sua região para o mundo, como se sentem ao fazer isso através da KerecsenSólyom?
Görög – Pra mim, essencialmente, o mais importante é fazer boa música. Claro que o que venha a ser uma boa música é uma questão muito difícil. Mas o essencial é que eu gosto do que estou fazendo. Junto a isso, é também importante fazer algo que seja único e especial! Acho que muita gente apenas escuta a música sem absorver a letra, e não há problema nisso, eu mesmo escuto muita música desse jeito. Acho que boa música pode se sustentar com ou sem a compreensão da letra, e pode demonstrar um tipo de humor também. Na nossa música os elementos da música folclórica húngara dão esse humor, o que é tipicamente nosso e de outras bandas húngaras (como Dalriada e Niburta). Na maioria das vezes usamos melodias folclóricas inteiras nas nossas músicas, e essas melodias são tocadas com instrumentos folclóricos autênticos, como flautas, gaita de fole, hurdy curdy, zurna, cobza... E para o segundo álbum gostaríamos de usar mais instrumentos folclóricos para criar mais cor e variedade sonora. Então, nessa visão, a missão cultural pode ser vista. Por outro lado, isto é algo interessante, porque você não apenas escuta Metal, mas através dele você pode aprender sobre o folclore de um país. Eu tenho escutado ultimamente muita música interessante da China, Mongólia, dos povos Bascos, Inca e até Folk Metal Brasileiro... Gostei de todos eles.
Eu também pensei nos ouvintes que gostariam de assimilar melhor nossas letras, então no nosso perfil do Facebook estão disponíveis as traduções das nossas letras para o Inglês e também um pequeno sumário sobre cada música. Estou pensando também em disponibilizar toda a saga/conto para que os ouvintes interessados em entender o mundo de KerecsenSólyom possam fazer isso.
Lucas – Gostaria de deixar uma mensagem aos leitores e ouvintes da Radio Metal?
Görög – Gostaria de dizer: protejam suas tradições e a cultura de seus ancestrais e mantenham o antigo fogo vivo!
Lucas – Obrigado pela entrevista.

Nenhum comentário:

Postar um comentário