Por Allan Kern
Com o lançamento de "Nimrod", em 1997, o Green Day deu os primeiros indícios de que não se contentaria em explorar apenas a fórmula de ganchos chicletudos que catapultou a banda ao superestrelato. A seguir, levou as próprias idiossincrasias até as últimas consequências em "Warning", de 2000, álbum produzido pela própria banda, que decidiu remover quase toda a distorção das guitarras, abusar dos violões e apostar em uma mixagem que jogava a cozinha de Mike Dirnt e Tré Cool em primeiro plano. Apesar da qualidade musical, o amadurecimento da banda foi largamente julgado como perda da inspiração e energia dos primeiros trabalhos. Além disso, as baixas vendas contribuíram para que muitos apostassem que ali se iniciava um declínio criativo do trio.
Foi então que eles pegaram o mundo de surpresa com "American Idiot". Lançado em 2004, o disco que gerou sucesso de público e crítica que a banda nunca havia experimentado antes. O êxito do álbum se deve à combinação de diversos fatores que o transformaram em um dos lançamentos mais relevantes da década, revelando um oportunismo que raras vezes permeia um lançamento fonográfico. De fato, aquele conturbado momento político ofereceu a justificativa perfeita para que o Green Day explorasse sua consciência social de forma a criar uma profunda identificação com o sentimento de revolta que habitava as cabeças pensantes dos Estados Unidos e do mundo inteiro, além de conquistar respeito como uma banda séria e intimamente ligada à realidade do seu tempo.
À parte o conjunto de circunstâncias favoráveis, "American Idiot" trouxe uma porção de elementos inéditos no som do Green Day. Além de inserir pela primeira vez um discurso politizado em suas canções, a banda surpreendeu a todos com um álbum conceitual contendo duas canções que ultrapassavam os nove minutos, cada uma dividia em cinco segmentos. Ao criar duas mini-óperas nos mesmos moldes de "A Quick One While He’s Away", também mostraram que a influência do THE WHO ia muito além da energia adolescente de "My Generation". Como o álbum foi estruturado em torno do conceito que permeava suas 13 faixas, podia ser ainda mais apreciado em seu todo do que simplesmente como mais um apanhado de ótimas canções.
Após uma exaustiva exposição nas rádios e TVs do mundo inteiro, uma turnê mundial que durou aproximadamente dois anos e um disco ao vivo centrado nas músicas de "American Idiot", cresceram as expectativas em torno do próximo álbum. Afinal, depois de um sucesso estrondoso gerado a partir de um profundo amadurecimento musical, voltar ao esquema antigo baseado em canções de conteúdo despretensioso poderia ser considerado um retrocesso. Então a possibilidade mais coerente seria dar seguimento à abordagem conscientizada de "American Idiot" e o grande desafio passou a ser a exploração deste novo modelo sem cair na mesmice. A banda agora era apontada por muitos novos fãs como a voz de sua geração e se via diante do compromisso de passar uma mensagem para a sociedade.
As pressões do grande público fizeram com que eles se voltassem às suas origens em busca do som descompromissado das bandas de garagem, mas tudo isso sem comprometer a integridade da banda responsável pelo grande manifesto musical da era Bush. Em uma espertíssima jogada, o trio lançou em 2008 o disco "Stop, Drop & Roll!!!" sob a alcunha de FOXBORO HOT TUBS. Ao desenvolver uma “nova” identidade eles puderam prestar um tributo às suas principais influências, explorando livremente o som e a estética típica do rock sessentista somado ao punch de HÜSKER DÜ e THE REPLACEMENTS. Assim, conseguiram se aliviar das pressões mercadológicas e criaram provavelmente o disco mais empolgante de suas carreiras.
Finalmente, no dia 15 de maio de 2009 saiu o aguardado sucessor de "American Idiot", intitulado "21st Century Breakdown". Como era de se esperar, o disco segue a mesma linha conceitual do anterior, o que abre precedentes para inevitáveis comparações e discussões sobre qual dos dois álbuns é o melhor. Na verdade, essa é uma questão subjetiva, pois é possível apontar a superioridade de ambos fazendo uso de argumentos igualmente sólidos. "American Idiot" e "21st Century Breakdown" são duas obras temáticas que representam furiosos protestos de uma juventude angustiada e insatisfeita, que precisa lutar contra forças sociais de todo tipo para encontrar o seu lugar em um mundo que fatalmente se aproxima de uma realidade caótica.
Partindo desse princípio, pode-se ressaltar a importância de "American Idiot" como o álbum divisor de águas responsável por elevar o Green Day a um novo patamar no cenário musical, como músicos respeitáveis e capacitados a transmitir uma mensagem séria, e num formato no qual poucos seriam capazes de articular com sucesso. Por fim, a conjuntura favorável daquele momento específico foi decisiva para a consagração de "American Idiot" e, como reza a sabedoria popular, um raio não cai duas vezes no mesmo lugar. Entretanto, apesar de no lançamento de "21st Century Breakdown" o Green Day já contar com o status de banda séria e não ter mais o fator novidade a seu favor, em muitos aspectos o novo álbum superou seu antecessor.
A elaboração da obra conceitual atingiu um nível mais profundo, com as 18 canções se conectando de forma a compor um todo ligeiramente mais coeso que o de "American Idiot". Mesmo explorando tema semelhante ao do álbum anterior através da relação entre um jovem casal protagonista, "21st Century Breakdown" mostrou um salto de qualidade nas composições de Billie Joe Armstrong, que passou a descrever suas inquietas visões cataclísmicas com notável sensibilidade lírica. Apesar de não haver um alvo claro como o governo Bush em "American Idiot", o último álbum mostrou um forte senso de propósito. Dividido em três atos, o disco narra as desventuras de Christian e Gloria na luta de vida ou morte pela recuperação da esperança na humanidade, perdida em algum momento da história recente.
Embora o álbum tenha sido construído a partir do conteúdo das letras, em nenhum momento a música ficou em segundo plano. A combinação de canções repletas de auto-referências, somada ao requinte da produção de Butch Vig (responsável por "Nevermind", clássico do Nirvana de 1991) foram os principais fatores que tornaram este o álbum mais representativo da carreira do Green Day, além de ser também o mais refinado em termos de acabamento. Ao longo do disco a banda destila o seu som através de uma variada gama de estilos que vão do rock de arena à crueza classuda a la "Warning", aliando os tradicionais rocks acelerados a baladonas com belos arranjos de piano. Em sua plenitude, "21st Century Breakdown" trouxe um pouco de tudo que o GREEN DAY já fez na carreira, mas com mais propriedade do que nunca.
Se a obra-prima do Green Day é "American Idiot" ou "21st Century Breakdown", pouco importa. O grande mérito da banda é manter vivo o interesse pelos discos de rock em uma época em que a internet estraçalhou o bem mais precioso daqueles que se consideram apaixonados por música. Num universo em que os álbuns estão caindo em obsolescência e a música atual começa a perder parte de suas feições ao fluir desimpedida pelos meandros obscuros da realidade virtual, o lançamento estrondoso de duas obras conceituais como essas requer culhões de aço, uma boa dose de talento e muita personalidade. Levar a essência anárquica das bibocas underground a estádios lotados sem perder a integridade é uma verdadeira proeza. E mais punk do que isso, impossível.
Foi então que eles pegaram o mundo de surpresa com "American Idiot". Lançado em 2004, o disco que gerou sucesso de público e crítica que a banda nunca havia experimentado antes. O êxito do álbum se deve à combinação de diversos fatores que o transformaram em um dos lançamentos mais relevantes da década, revelando um oportunismo que raras vezes permeia um lançamento fonográfico. De fato, aquele conturbado momento político ofereceu a justificativa perfeita para que o Green Day explorasse sua consciência social de forma a criar uma profunda identificação com o sentimento de revolta que habitava as cabeças pensantes dos Estados Unidos e do mundo inteiro, além de conquistar respeito como uma banda séria e intimamente ligada à realidade do seu tempo.
À parte o conjunto de circunstâncias favoráveis, "American Idiot" trouxe uma porção de elementos inéditos no som do Green Day. Além de inserir pela primeira vez um discurso politizado em suas canções, a banda surpreendeu a todos com um álbum conceitual contendo duas canções que ultrapassavam os nove minutos, cada uma dividia em cinco segmentos. Ao criar duas mini-óperas nos mesmos moldes de "A Quick One While He’s Away", também mostraram que a influência do THE WHO ia muito além da energia adolescente de "My Generation". Como o álbum foi estruturado em torno do conceito que permeava suas 13 faixas, podia ser ainda mais apreciado em seu todo do que simplesmente como mais um apanhado de ótimas canções.
Após uma exaustiva exposição nas rádios e TVs do mundo inteiro, uma turnê mundial que durou aproximadamente dois anos e um disco ao vivo centrado nas músicas de "American Idiot", cresceram as expectativas em torno do próximo álbum. Afinal, depois de um sucesso estrondoso gerado a partir de um profundo amadurecimento musical, voltar ao esquema antigo baseado em canções de conteúdo despretensioso poderia ser considerado um retrocesso. Então a possibilidade mais coerente seria dar seguimento à abordagem conscientizada de "American Idiot" e o grande desafio passou a ser a exploração deste novo modelo sem cair na mesmice. A banda agora era apontada por muitos novos fãs como a voz de sua geração e se via diante do compromisso de passar uma mensagem para a sociedade.
As pressões do grande público fizeram com que eles se voltassem às suas origens em busca do som descompromissado das bandas de garagem, mas tudo isso sem comprometer a integridade da banda responsável pelo grande manifesto musical da era Bush. Em uma espertíssima jogada, o trio lançou em 2008 o disco "Stop, Drop & Roll!!!" sob a alcunha de FOXBORO HOT TUBS. Ao desenvolver uma “nova” identidade eles puderam prestar um tributo às suas principais influências, explorando livremente o som e a estética típica do rock sessentista somado ao punch de HÜSKER DÜ e THE REPLACEMENTS. Assim, conseguiram se aliviar das pressões mercadológicas e criaram provavelmente o disco mais empolgante de suas carreiras.
Finalmente, no dia 15 de maio de 2009 saiu o aguardado sucessor de "American Idiot", intitulado "21st Century Breakdown". Como era de se esperar, o disco segue a mesma linha conceitual do anterior, o que abre precedentes para inevitáveis comparações e discussões sobre qual dos dois álbuns é o melhor. Na verdade, essa é uma questão subjetiva, pois é possível apontar a superioridade de ambos fazendo uso de argumentos igualmente sólidos. "American Idiot" e "21st Century Breakdown" são duas obras temáticas que representam furiosos protestos de uma juventude angustiada e insatisfeita, que precisa lutar contra forças sociais de todo tipo para encontrar o seu lugar em um mundo que fatalmente se aproxima de uma realidade caótica.
Partindo desse princípio, pode-se ressaltar a importância de "American Idiot" como o álbum divisor de águas responsável por elevar o Green Day a um novo patamar no cenário musical, como músicos respeitáveis e capacitados a transmitir uma mensagem séria, e num formato no qual poucos seriam capazes de articular com sucesso. Por fim, a conjuntura favorável daquele momento específico foi decisiva para a consagração de "American Idiot" e, como reza a sabedoria popular, um raio não cai duas vezes no mesmo lugar. Entretanto, apesar de no lançamento de "21st Century Breakdown" o Green Day já contar com o status de banda séria e não ter mais o fator novidade a seu favor, em muitos aspectos o novo álbum superou seu antecessor.
A elaboração da obra conceitual atingiu um nível mais profundo, com as 18 canções se conectando de forma a compor um todo ligeiramente mais coeso que o de "American Idiot". Mesmo explorando tema semelhante ao do álbum anterior através da relação entre um jovem casal protagonista, "21st Century Breakdown" mostrou um salto de qualidade nas composições de Billie Joe Armstrong, que passou a descrever suas inquietas visões cataclísmicas com notável sensibilidade lírica. Apesar de não haver um alvo claro como o governo Bush em "American Idiot", o último álbum mostrou um forte senso de propósito. Dividido em três atos, o disco narra as desventuras de Christian e Gloria na luta de vida ou morte pela recuperação da esperança na humanidade, perdida em algum momento da história recente.
Embora o álbum tenha sido construído a partir do conteúdo das letras, em nenhum momento a música ficou em segundo plano. A combinação de canções repletas de auto-referências, somada ao requinte da produção de Butch Vig (responsável por "Nevermind", clássico do Nirvana de 1991) foram os principais fatores que tornaram este o álbum mais representativo da carreira do Green Day, além de ser também o mais refinado em termos de acabamento. Ao longo do disco a banda destila o seu som através de uma variada gama de estilos que vão do rock de arena à crueza classuda a la "Warning", aliando os tradicionais rocks acelerados a baladonas com belos arranjos de piano. Em sua plenitude, "21st Century Breakdown" trouxe um pouco de tudo que o GREEN DAY já fez na carreira, mas com mais propriedade do que nunca.
Se a obra-prima do Green Day é "American Idiot" ou "21st Century Breakdown", pouco importa. O grande mérito da banda é manter vivo o interesse pelos discos de rock em uma época em que a internet estraçalhou o bem mais precioso daqueles que se consideram apaixonados por música. Num universo em que os álbuns estão caindo em obsolescência e a música atual começa a perder parte de suas feições ao fluir desimpedida pelos meandros obscuros da realidade virtual, o lançamento estrondoso de duas obras conceituais como essas requer culhões de aço, uma boa dose de talento e muita personalidade. Levar a essência anárquica das bibocas underground a estádios lotados sem perder a integridade é uma verdadeira proeza. E mais punk do que isso, impossível.
Fonte desta matéria: Green Day Inc
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