24 de agosto de 2010

Iron Maiden: por que tanta polêmica entre os fãs?

O lançamento de um novo disco do IRON MAIDEN, como sempre, é um evento à parte no cenário do heavy metal mundial. Cabe nos dedos de uma mão (e sem usá-los todos) o número de bandas dentro do rock pesado capazes de provocar semelhante mobilização, polêmica e paixão. Dezenas de resenhas são escritas e publicadas nos mais variados veículos e a velha discussão acerca do álbum, das expectativas geradas e das impressões sobre o mesmo tomam conta das rodas de conversa, dos fóruns de internet e de qualquer outro lugar onde se possa reunir um grupo de rockeiros. Este redator inclusive foi mais um a fazer um review sobre o trabalho. No entanto, quando se escreve uma análise sobre determinado disco, acaba havendo a necessidade de obedecer algumas regras de escrita e se ater ao objeto que está sendo avaliado. Com isso, por mais que se tente dar ao texto um caráter despojado ou mais abrangente, ele normalmente ainda guarda uma certa formalidade. Hoje, o que será tentado aqui é uma conversa informal, sem a necessidade de seguir muitas regras e onde o objetivo não será a análise do disco, mas observar as reações que ele tem provocado entre os fãs e tentar entender por que o Maiden causa tanta polêmica.

Existe uma coisa que tem grande chance de acontecer (ou o melhor seria dizer ‘não acontecer’): se já houve um momento onde os álbuns do Iron Maiden  eram unanimidade entre seus fãs, se esse dia realmente já existiu, como lá nos tempos de “Piece Of Mind” e “Powerslave”, já que nem o “The Number Of The Beast” foi unanimidade em seu lançamento, é bem possível que esse momento nunca mais volte a ocorrer, independente do que a banda lançar. E isso tem tão grandes chances de acontecer por um motivo simples: hoje o Iron Maiden  trabalha para tipos diferentes de fã em sua essência, que guardam entre si como característica comum apenas o fato de serem admiradores do gênero musical heavy metal.

Você já deve ter lido ou ouvido em algum lugar que o grupo inglês não tem grande variabilidade em sua música, que faz sempre o mesmo tipo de som, que nunca inova, etc. Quem diz isso baseia-se no fato de suas canções seguirem progressões harmônicas muito semelhantes entre si, além de eles sempre introduzirem algumas características básicas, que definem o seu som, como as guitarras dobradas, o baixo e os riffs galopantes, a marcação típica da bateria. Ledo engano. Embora tudo isso seja correto, se há alguém no metal que tem trabalhos totalmente variados em sua discografia, por mais que possam parecer semelhantes entre si, esse alguém é o Iron Maiden. Cada disco deles tem uma característica, um clima e uma identidade próprias. Por isso mesmo, a banda conseguiu e ainda consegue atingir um número tão grande de pessoas. Afinal, se você ouvir “Killers”, “Somewhere In Time”, “Fear Of The Dark” e “The X Factor”, perceberá que são títulos de um mesmo grupo, mas ao mesmo tempo são tão distintos.

Onde se quer chegar com isso tudo? Hoje, pode-se dizer que o Maiden tem três tipos básicos de fãs, divididos em outros subtipos. Há aqueles que se amarram no som antigo de Steve Harris e cia e que têm grandes dificuldades em se acostumar com a nova tendência de sonoridade adotada pelo conjunto nesses últimos anos. Existem aqueles (sim, eles existem e não são tão poucos assim) que consideram a banda hoje muito mais madura e com uma sonoridade muito mais rica e complexa do que em outros tempos. E também temos os que admiram todas as fases do agora sexteto, esses normalmente dando alguma preferência aos chamados ‘golden years’, mas também valorizando muito a fase atual. Fora isso, podemos fragmentar ainda mais a coisa, já que cada fase específica também tem seus fãs radicais bem como seus detratores. Há quem considere a crueza, a brutalidade e a energia quase punk dos tempos de Paul Di’Anno como o verdadeiro Maiden. Talvez a maioria curta mais a usina de heavy metal dos primeiros anos de Bruce Dickinson e do trio “The Number”, “Piece Of Mind” e “Powerslave”. Outros ampliam essa fase para o metal elaborado e cheio de novos elementos da segunda metade da década de 80, com “Somewhere In Time” e “Seventh Son Of A Seventh Son”. 

Depois, veio o período hard/heavy de “No Prayer For The Dying” e “Fear Of The Dark”. De forma inesperada, chegou ao mundo a controversa ‘era Blaze’, com seu tom sombrio e introspectivo. Pra encerrar, a volta de Dickinson e do guitarrista Adrian Smith inaugurou uma nova fase, calcada num som mais cadenciado e com mais influências progressivas.

A banda conseguiu angariar novos adeptos para suas fileiras em cada uma de suas obras. É lógico que um fã conhece um artista por um disco, seja ele qual for, e depois acaba descobrindo o restante do material do grupo em questão. Só que a Donzela, a cada novo lançamento, parecia e parece conquistar uma nova horda de seguidores. Portanto, a conclusão a que se chega é de que se não houvesse grandes doses de talento em cada um desses discos eles não seriam capazes de renovar por três gerações sua legião de fãs. Aí eu pergunto (e o leitor me permita passar o texto agora para primeira pessoa): como agradar ao mesmo tempo a tanta gente, que se identifica com fases tão distintas de uma mesma banda? Por isso mesmo, será bem difícil para o ‘coitado’ do Iron voltar a ser uma unanimidade mesmo entre sua base de fãs. A minha opinião sobre o mais recente disco eu já dei em outro texto. Não estou aqui hoje para discuti-lo, mas para levantar para discussão todas as polêmicas que hoje se suscita baseando-se nele. Só que não estão de todo errados aqueles que argumentam, como já vi aqui mesmo algumas vezes, que se há gente que considera que o grupo tem cometido equívocos há uns vinte anos, por que continuar seguindo-o depois de tanto tempo.

O Maiden ‘das antigas’ também tinha músicas bem trabalhadas, melodiosas, com mudanças de tempo, cheias de variações, e tudo isso atraía (e atrai até hoje) um contingente enorme de headbangers. 

Todavia, o que parecia ser mais sedutor no som da banda era seu ritmo acelerado, sua energia descomunal e a empolgação que isso conseguia despertar no ouvinte. O som dos últimos anos cada vez mais se caracteriza por um cuidado maior nos arranjos, por uma maior complexidade e também por uma maior cadência. É uma música mais lenta, mais reflexiva, que reflete mais as influências que os integrantes da banda têm de um som progressivo, aparentemente feito mais para se contemplar do que para se agitar.

Nada disso seria problema se esses fãs hoje não promovessem discussões infindáveis e quase que uma guerra entre os que gostam dessa nova fase do grupo e os que a consideram fraca, enjoativa e sem inspiração. Isso acontece já faz um bom tempo e o lançamento de “The Final Frontier” é apenas mais uma oportunidade de se observar toda a polêmica. A pergunta que se faz é: quem tem razão nessa história toda?

E a resposta é muito simples: ninguém. Em algumas situações pode ser observado que algumas pessoas chegam a se incomodar de verdade com a opinião de outras. É como se todo fã da banda fosse obrigado a gostar de tudo o que eles lançam e, no caso de não gostar, esse mesmo fã fosse alguém incapaz de evoluir, apegado a um passado que não volta mais e para quem qualquer coisa lançada pelo sexteto inglês jamais será satisfatória, por melhor que seja. Da mesma forma, a lógica inversa também é válida. Temos gente que não admite que a Donzela possa agradar a tanta gente com essa nova proposta, como se ela fosse realmente ruim. Daí, passa a se considerar que aquele que aprecia os novos sons do conjunto seja algum fanático, incapaz de perceber os defeitos de sua banda favorita e para quem qualquer ‘porcaria’ que os caras coloquem no mercado é uma obra perfeita.

Ora, nem um lado e nem o outro têm razão, ainda mais quando levamos em conta o que foi discutido há pouco sobre a banda atrair perfis de público variados dentro do metal. É salutar e necessário que as pessoas tenham opiniões diversas, que tenham o direito de expô-las e que tenham lugar para fazer isso, bem como citar os motivos que as fazem achar algo bom ou ruim. No entanto, discordar de alguém nem sempre é veredicto de que o outro esteja errado, ainda mais em se tratando de algo tão pessoal quanto ouvir música. Um disco ou uma música podem e irão mexer com várias pessoas e não conseguirão produzir o mesmo efeito em inúmeras outras. Quem garante que se o Maiden lançasse hoje um novo “The Number Of The Beast” não iria aparecer alguém pra dizer que deram um passo atrás, que abortaram uma tendência de modernidade que estavam seguindo, que tentam sem o mesmo brilho copiar o passado, dentre outros argumentos? Afinal de contas, existe aquela história do gosto, que diz que cada um tem o seu. E é irônico pensar que na eventualidade de um novo show da banda, todos esses que tanto discordam entre si estarão enfileirados lado a lado, muitas vezes abraçados, cantando a plenos pulmões músicas que agora um exalta e o outro desdenha.

Por tudo isso, caro leitor, você deve ter percebido que o objetivo hoje não foi tomar partido seu ou daquele que discorda de você, mas provocar ambos. É lógico que pode acontecer, mas sinceramente não sei se o Iron Maiden lançará algum dia uma nova obra que agrade todo mundo e que não suscite essas discussões que vemos por aí todo santo dia. A banda já não é mais apenas uma banda, é uma instituição, e chega a tanta gente de características diversas que será complicado saciar todas as suas camadas de fãs com a mesma eficiência. Discuta (no bom sentido da palavra), argumente, mas não perca de vista o respeito pela opinião e pelo gosto do outro, até porque normalmente as pessoas não mudam de ideia pelo que ouvem de alguém e, sim, por aquilo que elas mesmas vão descobrindo.

Por Ronaldo Costa |

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