Um dos prazeres que muitos fãs de progressivo possuem é de disponibilizar, baixar ou adquirir materiais inéditos e gravações de shows de suas bandas prog preferidas. É um hobby que ganha certo “charme” se pegarmos grupos antigos e com uma longa carreira musical, ou seja, com um aparentemente bem diversificado “acervo” de shows e apresentações. Aqui está um pouco da história dessa atividade dentro do rock progressivo.
Definição, origem e rápido histórico
Bootlegs (bootlegging, ligado ao ato da distribuição desse material) ou, segundo a classificação feita por fãs ligados ao Pink Floyd, “Roio” (“Record of Indeterminate Origin”), são gravações de áudio e vídeo feitas em apresentações de grupos e artistas por fãs ou por pessoas que de alguma forma quiseram registrar determinado concerto. Posteriormente, são distribuídos ou comercializados entre os fãs ou por consumidores em geral que desejam obter esse tipo de material. Inicialmente, o termo também era ligado a um material de estúdio não gravado ou a outros tipos de raridades, como apresentações em rádios ou em programas de TV, mas esse tipo de bootleg diminuiu vertiginosamente a partir da década de 90, à medida que os artistas disponibilizaram ou oficializaram esse tipo de material.
Não se deve confundir esse tipo de atividade com a pirataria ligada ao download e a gravações de discos oficiais de estúdio (pra quem era mais antigo, nas velhas fitas cassete e atualmente ligado a downloads em programas como Soulseek e E-mule), porém ambos se assemelham por serem um material que infringe os direitos autorais dos artistas, pois além de não-oficiais, os mesmos não recebem qualquer remuneração ou retorno com esse tipo de material.
A prática de gravações não autorizadas existiu desde os primórdios da indústria fonográfica, no final da década de 1870, mas somente tomou alguma forma muitas décadas depois, tendo seu “marco zero” em 1969, com o lançamento do que foi considerado o primeiro bootleg, ‘The great white wonder’, que registrava gravações inéditas do cantor Bob Dylan feitas oito anos antes. A partir daí, viu-se um vertiginoso crescimento desse tipo de atividade nos anos 70, tendo como alvo principal os grandes grupos da época como Rolling Stones, Led Zeppelin, Deep Purple e Pink Floyd, e que se estende até os dias de hoje.
“Registrando” o progressivo: em fita ou CD...
O processo de gravação de um bootleg (ou Roio) é relativamente simples. Caso consiga passar a segurança do show ou caso tenha seus contatos com a produção do mesmo, é só sentar em um local privilegiado com seu gravador ou filmadora (ou celular) e registrar a apresentação. Já em relação a conseguir material de estúdio inédito ou raro, apesar de mais difícil, às vezes a própria gravadora cede ou vaza esse tipo de material.
Os primeiros registros de bootlegs no rock progressivo datam do início dos anos 70. A qualidade das gravações nesses primeiros anos na maioria das vezes era sofrível. Isso era explicado pelos precários equipamentos de gravação utilizados (a fita cassete existia há apenas alguns anos antes, desde 1964), da inexperiência dos que tentavam registrar os shows e da agitação da platéia, que chegava às vezes a encobrir a musica tocada. Parte da solução foi encontrada no posicionamento estratégico (leia-se em frente ao palco) dos que registravam o show, ou “jeitinhos”, como de pegar a gravação diretamente da mesa de som (muitas vezes com a ajuda do engenheiro de som). Os bootlegs que registravam transmissões de rádio de shows ou de apresentações em estúdio possuíam na maioria das vezes melhor qualidade sonora, apesar de às vezes não serem tão raros ou valiosos quanto os registros feitos por gravações amadoras.
Entre a década de 70 até o inicio dos anos 90, a Itália, seguida pelo Japão, foi o país com maior numero de “gravadoras” que disponibilizaram registros de bootlegs ligados ao progressivo. Isso é explicado pelo considerável sucesso que o estilo fez no país por quase toda a década de 70 e por facilidades legais que permitiram ao país possuir um grande e rendoso mercado de gravações ilegais, que só sairia de cena com uma maior fiscalização do governo italiano e com o aparecimento da Internet. Deve-se citar aqui também a revista Hot Wacks, “bíblia” dos colecionadores de bootlegs (ligados ou não ao prog), que há cerca de trinta e cinco anos lista os principais lançamentos ligados a esse tipo de gravação.
Os dois grupos mais pirateados e com mais registros dentro do progressivo são o Pink Floyd e o Genesis. Ambas as bandas possuem uma impressionante quantidade de bootlegs lançados, chegando tranqüilamente talvez a algumas centenas. Muitos desses registros chegam a superar gravações oficiais, seja em qualidade, seja pela performance.
O Pink Floyd teve talvez um dos casos ligados aos bootlegs mais conhecidos. No final de 1974, ainda rendendo com o sucesso do disco “Dark side Of the Moon”, foi lançado um disco pretensamente “novo” da banda, chamado “Brithish winter tour’ 74”, na verdade registrando um show do grupo em Londres na época. Entretanto, o interesse do publico em obter algum material inédito do grupo acabou fazendo com que esse disco não oficial tivesse uma grande procura, tendo as vendagens desse trabalho chegado ao surpreendente número de 50.000 cópias vendidas. A banda também foi uma das primeiras a ter um grupo dedicado à recuperação, restauração e disseminação de vídeos e gravações raras entre seus fãs, a Harvested, talvez uma das melhores e mais eficientes nesse sentido, até hoje em atividade no site www.harvested.org.
O Genesis atualmente é o que mais possui grupos ligados à remasterização e à distribuição de material relacionado à banda. Entre vários grupos, podem ser citados o Hogweed, Fade, Burp e o I4detail, todos gratuitos, ligados a um sistema de troca ou de “videira” (onde a pessoa recebe certo material e tem que distribuí-lo para um número determinado de pessoas).
Outras bandas que receberam forte atenção dos “bootlegers” foram o Yes, Camel, Rush, Van Der Graaf Generator (nesse caso principalmente na Itália), King Crimson, Tangerine Dream, Kraftwerk, Marillion, entre outros. No campo vanguardista, cita-se um bom número de registros de grupos ícones dessa vertente como o Soft Machine, Henry Cow, Can, Magma e, dos grupos mais recentes, o Sleepytime Gorilla Museum.
Nos anos 90, com o advento de gravadores digitais, esses registros melhoraram consideravelmente de qualidade. Isso pode ser percebido tanto em gravações ligados aos medalhões do estilo como em grupos mais obscuros ou aos ligados a vertentes como o post rock ou ao metal progressivo. Outra mudança foi a substituição da comercialização desse tipo de material por sistemas de trocas ou do download dessas gravações na Internet.
... e em filme e vídeo
Os registros amadores de shows e apresentações em imagem tiveram um caráter mais problemático, devido aos equipamentos comumente utilizados e pela falta de mobilidade que muitas dessas apresentações apresentavam, onde muitas vezes longe do palco e com apenas uma câmera filmando, às vezes um tanto monótonos. Com o surgimento do filme e câmeras portáteis em 8 mm a partir de 1965, a qualidade de alguns desses registros ficou um pouco melhor quando comparada às de máquinas mais antigas, mas continuaram com os mesmos problemas de suas antecessoras, no sentido de terem uma cor não tão nítida e de muitas vezes só poderem gravar a imagem e não o som.
Entretanto, alguns desses registros são peças valiosas de um período em que a maioria das bandas progressivas, por diferentes motivos, não se preocuparam em registrar suas apresentações na primeira metade dos anos 70. O Gentle Giant entre 1970-72, o Pink Floyd entre 1974-77, as turnês dos álbuns “Thick as a brick” (em 1972) e “A passion play” (em 1973) do Jethro Tull e a turnê do Genesis do álbum “The lamb lies down on Broadway” entre 1974-75 praticamente têm todas as suas imagens capturadas somente nessas gravações amadoras.
Outra fonte em vídeo dessa época são alguns programas de TV que deram algum espaço para o progressivo, como, por exemplo, os programas Beat Club, Rockpalast (ambos na Alemanha) e o Pop Show (Bélgica) e de emissoras como a ORTF (França), a BBC (Inglaterra) e de algumas emissoras espaças nos Estados Unidos que exibiram apresentações de alguns grupos ligados ao rock progressivo.
A partir dos anos 80, com o surgimento de novos tipos de filmadoras e com a consolidação da fita VHS, esses registros melhoraram de qualidade e as apresentações passaram a ser registradas muitas vezes na íntegra. Porém, com os grupos prog decidindo registrar em vídeo suas apresentações, o nível de raridade desse tipo de registro caiu consideravelmente, apesar de ser ainda de grande valor para os fãs. O Pink Floyd (de uma forma um tanto irônica) e o Gentle Giant, em seus lançamentos recentes em DVD, usaram esse tipo de material em seus bônus.
Opiniões e (re)ações
A opinião dos músicos progressivos em relação às gravações ilegais de shows, de forma um tanto óbvia, se dividem entre aqueles que são contra e os que, apesar de não serem necessariamente a favor, não vêem problemas nesse tipo de atividade.
Na primeira corrente, temos exemplos de músicos como Carl Palmer, Steve Hackett, Bill Bruford e, principalmente, Robert Fripp, que desaprovam veementemente essa prática, chegando a tentar criar movimentos (mal sucedidos) com o intuito de coibir essa atividade. Do lado dos “despreocupados”, temos, por exemplo, Roger Waters e David Gilmour do Pink Floyd, que chegaram a dizer que viam essa prática como um “hobby saudável” e bandas como Genesis, Yes e Van Der Graaf Generator, que se não apoiavam a prática, também não fizeram grande oposição à mesma.
Algumas iniciativas isoladas foram feitas direta ou indiretamente para coibir esse tipo de atividade. Robert Fripp, por exemplo, além de disponibilizar vários box-sets com gravações ao vivo do King Crimson, fundou junto com sua gravadora Discipline Global Mobile, em 1998, o King Crimson Collectors Club, uma espécie de “clube” em que os sócios, a partir de uma taxa, ganhavam CDs com gravações ao vivo do grupo. Com o baixo retorno oferecido, o KCCC entrou em recesso, sendo que as gravações são oferecidas agora virtualmente, e se pode obter determinado show em formato MP3 ou em FLAC. O Marillion também fez algo parecido, com o Front Row Club, disponibilizando material ao vivo da banda tanto da fase Fish quanto Hogarth, mas que lentamente está transferindo seus serviços para os downloads dessas gravações em formatos digitais.
Já o Dream Theater fez iniciativa semelhante, e aqui mais bem sucedida, oficializando e comercializando gravações originais de shows ou de faixas não oficiais em estúdio pela sua gravadora, a Ytsejam records. O Camel também foi outro grupo que chegou a oficializar alguns registros em áudio e vídeo de seus shows, postura seguida por bandas como o Godspeed You! Black Emperor, que disponibilizou um site para o download de gravações ao vivo da banda.
O grupo Emerson Lake & Palmer, por outro lado, teve uma interessante e até mesmo criativa iniciativa. Entre 2001 e 2006, o trio lançou quatro caixas oficializando bootlegs do grupo, usando a mesma capa e nome com que esse material era comercializado quando era não oficial. Essas caixas obtiveram um relativo retorno comercial. Já Frank Zappa nesse sentido radicalizou, oficializando no início dos anos 90 todos os botlegs lançados sobre sua carreira.
Entretanto, outros casos de “oficialização” de material inédito nem sempre saem de uma forma eficiente. O exemplo mais gritante foi o lançamento do duo alemão Neu! dos tenebrosos “Neu live 72” (na verdade um registro precário de um ensaio da banda) e "Neu! IV" (fracas sobras de estúdio de gravações do grupo na década de 80), feitos na verdade para cumprir lacunas contratuais de um dos membros do grupo (Klaus Dinger, que faleceu este ano) com sua antiga gravadora. Esses discos enterraram de vez a possibilidade de alguma reunião ao grupo e fez com que os antigos membros quase se acionassem judicialmente. Outros casos parecidos ocorreram na Itália, com lançamentos duvidosos ligados a grupos como Area e Museo Rosembach.
Mas a prática de adquirir ou de gravar shows e apresentações de nossos grupos favoritos, independente do formato ou do suporte dessas gravações, sempre vai fazer parte da cultura musical dos fãs de rock progressivo (e de outros estilos também). No meu caso, tenho até alguns bons títulos aqui em casa (ehehehe...).
Em relação à cena brasileira, infelizmente a busca de material inédito se mistura também ao de material oficial, em que até alguns lançamentos oficiais foram e são prejudicados por diversos e diferentes fatores do nosso problemático meio musical e de seu mal cuidado acervo.
10 bootlegs recomendados de rock progressivo
Yes – “Not fragile” (São Francisco, 10/03/1972)
Genesis – “Fade004” (Montreal, Canadá, 21/04/1974)
Tangerine Dream – Live! Improvised! (Rheims, Alemanha, 09/12/1974)
Pink Floyd – Plays the animals (Oakland, California, 09/05/1977)
Henry Cow – Live in Amsterdam (Holanda, 16/12/1977)
Marillion – Hammersmith Odeon (Londres, 18/01/1988)
Rush – It’s all about music (Boston, 11/09/1996)
Camel – Live at São Paulo (28/03/2001)
Opeth – Providence (Rhode Island, Estados Unidos, 18/07/2003)
Tortoise – Live in Chicago (28/11/2003)
Leitura recomendada
“Bootleg! The rise & fall of the secret recording industry” (2004), de Clinton Heylin.
Por Roberto Lopes
Fonte:Whiplash
Definição, origem e rápido histórico
Bootlegs (bootlegging, ligado ao ato da distribuição desse material) ou, segundo a classificação feita por fãs ligados ao Pink Floyd, “Roio” (“Record of Indeterminate Origin”), são gravações de áudio e vídeo feitas em apresentações de grupos e artistas por fãs ou por pessoas que de alguma forma quiseram registrar determinado concerto. Posteriormente, são distribuídos ou comercializados entre os fãs ou por consumidores em geral que desejam obter esse tipo de material. Inicialmente, o termo também era ligado a um material de estúdio não gravado ou a outros tipos de raridades, como apresentações em rádios ou em programas de TV, mas esse tipo de bootleg diminuiu vertiginosamente a partir da década de 90, à medida que os artistas disponibilizaram ou oficializaram esse tipo de material.
Não se deve confundir esse tipo de atividade com a pirataria ligada ao download e a gravações de discos oficiais de estúdio (pra quem era mais antigo, nas velhas fitas cassete e atualmente ligado a downloads em programas como Soulseek e E-mule), porém ambos se assemelham por serem um material que infringe os direitos autorais dos artistas, pois além de não-oficiais, os mesmos não recebem qualquer remuneração ou retorno com esse tipo de material.
A prática de gravações não autorizadas existiu desde os primórdios da indústria fonográfica, no final da década de 1870, mas somente tomou alguma forma muitas décadas depois, tendo seu “marco zero” em 1969, com o lançamento do que foi considerado o primeiro bootleg, ‘The great white wonder’, que registrava gravações inéditas do cantor Bob Dylan feitas oito anos antes. A partir daí, viu-se um vertiginoso crescimento desse tipo de atividade nos anos 70, tendo como alvo principal os grandes grupos da época como Rolling Stones, Led Zeppelin, Deep Purple e Pink Floyd, e que se estende até os dias de hoje.
“Registrando” o progressivo: em fita ou CD...
O processo de gravação de um bootleg (ou Roio) é relativamente simples. Caso consiga passar a segurança do show ou caso tenha seus contatos com a produção do mesmo, é só sentar em um local privilegiado com seu gravador ou filmadora (ou celular) e registrar a apresentação. Já em relação a conseguir material de estúdio inédito ou raro, apesar de mais difícil, às vezes a própria gravadora cede ou vaza esse tipo de material.
Os primeiros registros de bootlegs no rock progressivo datam do início dos anos 70. A qualidade das gravações nesses primeiros anos na maioria das vezes era sofrível. Isso era explicado pelos precários equipamentos de gravação utilizados (a fita cassete existia há apenas alguns anos antes, desde 1964), da inexperiência dos que tentavam registrar os shows e da agitação da platéia, que chegava às vezes a encobrir a musica tocada. Parte da solução foi encontrada no posicionamento estratégico (leia-se em frente ao palco) dos que registravam o show, ou “jeitinhos”, como de pegar a gravação diretamente da mesa de som (muitas vezes com a ajuda do engenheiro de som). Os bootlegs que registravam transmissões de rádio de shows ou de apresentações em estúdio possuíam na maioria das vezes melhor qualidade sonora, apesar de às vezes não serem tão raros ou valiosos quanto os registros feitos por gravações amadoras.
Entre a década de 70 até o inicio dos anos 90, a Itália, seguida pelo Japão, foi o país com maior numero de “gravadoras” que disponibilizaram registros de bootlegs ligados ao progressivo. Isso é explicado pelo considerável sucesso que o estilo fez no país por quase toda a década de 70 e por facilidades legais que permitiram ao país possuir um grande e rendoso mercado de gravações ilegais, que só sairia de cena com uma maior fiscalização do governo italiano e com o aparecimento da Internet. Deve-se citar aqui também a revista Hot Wacks, “bíblia” dos colecionadores de bootlegs (ligados ou não ao prog), que há cerca de trinta e cinco anos lista os principais lançamentos ligados a esse tipo de gravação.
Os dois grupos mais pirateados e com mais registros dentro do progressivo são o Pink Floyd e o Genesis. Ambas as bandas possuem uma impressionante quantidade de bootlegs lançados, chegando tranqüilamente talvez a algumas centenas. Muitos desses registros chegam a superar gravações oficiais, seja em qualidade, seja pela performance.
O Pink Floyd teve talvez um dos casos ligados aos bootlegs mais conhecidos. No final de 1974, ainda rendendo com o sucesso do disco “Dark side Of the Moon”, foi lançado um disco pretensamente “novo” da banda, chamado “Brithish winter tour’ 74”, na verdade registrando um show do grupo em Londres na época. Entretanto, o interesse do publico em obter algum material inédito do grupo acabou fazendo com que esse disco não oficial tivesse uma grande procura, tendo as vendagens desse trabalho chegado ao surpreendente número de 50.000 cópias vendidas. A banda também foi uma das primeiras a ter um grupo dedicado à recuperação, restauração e disseminação de vídeos e gravações raras entre seus fãs, a Harvested, talvez uma das melhores e mais eficientes nesse sentido, até hoje em atividade no site www.harvested.org.
O Genesis atualmente é o que mais possui grupos ligados à remasterização e à distribuição de material relacionado à banda. Entre vários grupos, podem ser citados o Hogweed, Fade, Burp e o I4detail, todos gratuitos, ligados a um sistema de troca ou de “videira” (onde a pessoa recebe certo material e tem que distribuí-lo para um número determinado de pessoas).
Outras bandas que receberam forte atenção dos “bootlegers” foram o Yes, Camel, Rush, Van Der Graaf Generator (nesse caso principalmente na Itália), King Crimson, Tangerine Dream, Kraftwerk, Marillion, entre outros. No campo vanguardista, cita-se um bom número de registros de grupos ícones dessa vertente como o Soft Machine, Henry Cow, Can, Magma e, dos grupos mais recentes, o Sleepytime Gorilla Museum.
Nos anos 90, com o advento de gravadores digitais, esses registros melhoraram consideravelmente de qualidade. Isso pode ser percebido tanto em gravações ligados aos medalhões do estilo como em grupos mais obscuros ou aos ligados a vertentes como o post rock ou ao metal progressivo. Outra mudança foi a substituição da comercialização desse tipo de material por sistemas de trocas ou do download dessas gravações na Internet.
... e em filme e vídeo
Os registros amadores de shows e apresentações em imagem tiveram um caráter mais problemático, devido aos equipamentos comumente utilizados e pela falta de mobilidade que muitas dessas apresentações apresentavam, onde muitas vezes longe do palco e com apenas uma câmera filmando, às vezes um tanto monótonos. Com o surgimento do filme e câmeras portáteis em 8 mm a partir de 1965, a qualidade de alguns desses registros ficou um pouco melhor quando comparada às de máquinas mais antigas, mas continuaram com os mesmos problemas de suas antecessoras, no sentido de terem uma cor não tão nítida e de muitas vezes só poderem gravar a imagem e não o som.
Entretanto, alguns desses registros são peças valiosas de um período em que a maioria das bandas progressivas, por diferentes motivos, não se preocuparam em registrar suas apresentações na primeira metade dos anos 70. O Gentle Giant entre 1970-72, o Pink Floyd entre 1974-77, as turnês dos álbuns “Thick as a brick” (em 1972) e “A passion play” (em 1973) do Jethro Tull e a turnê do Genesis do álbum “The lamb lies down on Broadway” entre 1974-75 praticamente têm todas as suas imagens capturadas somente nessas gravações amadoras.
Outra fonte em vídeo dessa época são alguns programas de TV que deram algum espaço para o progressivo, como, por exemplo, os programas Beat Club, Rockpalast (ambos na Alemanha) e o Pop Show (Bélgica) e de emissoras como a ORTF (França), a BBC (Inglaterra) e de algumas emissoras espaças nos Estados Unidos que exibiram apresentações de alguns grupos ligados ao rock progressivo.
A partir dos anos 80, com o surgimento de novos tipos de filmadoras e com a consolidação da fita VHS, esses registros melhoraram de qualidade e as apresentações passaram a ser registradas muitas vezes na íntegra. Porém, com os grupos prog decidindo registrar em vídeo suas apresentações, o nível de raridade desse tipo de registro caiu consideravelmente, apesar de ser ainda de grande valor para os fãs. O Pink Floyd (de uma forma um tanto irônica) e o Gentle Giant, em seus lançamentos recentes em DVD, usaram esse tipo de material em seus bônus.
Opiniões e (re)ações
A opinião dos músicos progressivos em relação às gravações ilegais de shows, de forma um tanto óbvia, se dividem entre aqueles que são contra e os que, apesar de não serem necessariamente a favor, não vêem problemas nesse tipo de atividade.
Na primeira corrente, temos exemplos de músicos como Carl Palmer, Steve Hackett, Bill Bruford e, principalmente, Robert Fripp, que desaprovam veementemente essa prática, chegando a tentar criar movimentos (mal sucedidos) com o intuito de coibir essa atividade. Do lado dos “despreocupados”, temos, por exemplo, Roger Waters e David Gilmour do Pink Floyd, que chegaram a dizer que viam essa prática como um “hobby saudável” e bandas como Genesis, Yes e Van Der Graaf Generator, que se não apoiavam a prática, também não fizeram grande oposição à mesma.
Algumas iniciativas isoladas foram feitas direta ou indiretamente para coibir esse tipo de atividade. Robert Fripp, por exemplo, além de disponibilizar vários box-sets com gravações ao vivo do King Crimson, fundou junto com sua gravadora Discipline Global Mobile, em 1998, o King Crimson Collectors Club, uma espécie de “clube” em que os sócios, a partir de uma taxa, ganhavam CDs com gravações ao vivo do grupo. Com o baixo retorno oferecido, o KCCC entrou em recesso, sendo que as gravações são oferecidas agora virtualmente, e se pode obter determinado show em formato MP3 ou em FLAC. O Marillion também fez algo parecido, com o Front Row Club, disponibilizando material ao vivo da banda tanto da fase Fish quanto Hogarth, mas que lentamente está transferindo seus serviços para os downloads dessas gravações em formatos digitais.
Já o Dream Theater fez iniciativa semelhante, e aqui mais bem sucedida, oficializando e comercializando gravações originais de shows ou de faixas não oficiais em estúdio pela sua gravadora, a Ytsejam records. O Camel também foi outro grupo que chegou a oficializar alguns registros em áudio e vídeo de seus shows, postura seguida por bandas como o Godspeed You! Black Emperor, que disponibilizou um site para o download de gravações ao vivo da banda.
O grupo Emerson Lake & Palmer, por outro lado, teve uma interessante e até mesmo criativa iniciativa. Entre 2001 e 2006, o trio lançou quatro caixas oficializando bootlegs do grupo, usando a mesma capa e nome com que esse material era comercializado quando era não oficial. Essas caixas obtiveram um relativo retorno comercial. Já Frank Zappa nesse sentido radicalizou, oficializando no início dos anos 90 todos os botlegs lançados sobre sua carreira.
Entretanto, outros casos de “oficialização” de material inédito nem sempre saem de uma forma eficiente. O exemplo mais gritante foi o lançamento do duo alemão Neu! dos tenebrosos “Neu live 72” (na verdade um registro precário de um ensaio da banda) e "Neu! IV" (fracas sobras de estúdio de gravações do grupo na década de 80), feitos na verdade para cumprir lacunas contratuais de um dos membros do grupo (Klaus Dinger, que faleceu este ano) com sua antiga gravadora. Esses discos enterraram de vez a possibilidade de alguma reunião ao grupo e fez com que os antigos membros quase se acionassem judicialmente. Outros casos parecidos ocorreram na Itália, com lançamentos duvidosos ligados a grupos como Area e Museo Rosembach.
Mas a prática de adquirir ou de gravar shows e apresentações de nossos grupos favoritos, independente do formato ou do suporte dessas gravações, sempre vai fazer parte da cultura musical dos fãs de rock progressivo (e de outros estilos também). No meu caso, tenho até alguns bons títulos aqui em casa (ehehehe...).
Em relação à cena brasileira, infelizmente a busca de material inédito se mistura também ao de material oficial, em que até alguns lançamentos oficiais foram e são prejudicados por diversos e diferentes fatores do nosso problemático meio musical e de seu mal cuidado acervo.
10 bootlegs recomendados de rock progressivo
Yes – “Not fragile” (São Francisco, 10/03/1972)
Genesis – “Fade004” (Montreal, Canadá, 21/04/1974)
Tangerine Dream – Live! Improvised! (Rheims, Alemanha, 09/12/1974)
Pink Floyd – Plays the animals (Oakland, California, 09/05/1977)
Henry Cow – Live in Amsterdam (Holanda, 16/12/1977)
Marillion – Hammersmith Odeon (Londres, 18/01/1988)
Rush – It’s all about music (Boston, 11/09/1996)
Camel – Live at São Paulo (28/03/2001)
Opeth – Providence (Rhode Island, Estados Unidos, 18/07/2003)
Tortoise – Live in Chicago (28/11/2003)
Leitura recomendada
“Bootleg! The rise & fall of the secret recording industry” (2004), de Clinton Heylin.
Por Roberto Lopes
Fonte:Whiplash
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