Uma das características mais legais do heavy metal (e do rock de uma forma geral) é a capacidade de “fundir” estilos. Por conseqüência disso, surgem milhares de rótulos para tentar explicar para o ouvinte “como é que é” o som de uma banda. De alguns anos para cá não é raro se deparar em revistas de metal com o rotulo que é o assunto desse artigo, “Folk Metal”.
A primeira dificuldade para se definir o que é esse tal de “folk metal” é definir o que exatamente é a música “folk”. A mídia costuma confundir muito (de forma justificável) o significado do rotulo “folk”, por que ele tem realmente mais de um significado. Por exemplo, se você perguntar para um fã de Bob Dylan ou Joan Baez o que é música folk, certamente ele ira responder que se trata de músicas cantadas com violão e com letras sociais. Mas no caso do “folk metal” a palavra “folk” refere-se a música folclórica de um país qualquer.
Outro ponto em que o público de metal costuma confundir-se é na diferença existente entre a música medieval e a música folclórica. A música medieval é a música de um período histórico e a música folclórica é a música de um determinado povo não importando a época. Apesar disso a música do período medieval ainda estava muito ligada à música do povo (folclórica) , e a linha entre a música erudita e a música popular era muito tênue, então para quem não ouviu muitas vezes a música medieval é fácil confundi-la com a música folclórica dos celtas, por exemplo.
Vou expor aqui algumas definições bem superficiais sobre tópicos de interesse para os que curtem folk-metal:
Música Celta: O termo música celta é muito controverso, pois os celtas como povo identificável não existem mais. Existem, sim, os povos em que a influência dos celtas é mais visível, como nas chamadas sete nações celtas: Escócia, Irlanda, Pais de Gales, Bretanha (região da França) , Galícia (Espanha) , Cornualha (Inglaterra) e a Ilha de Mann (Grã Bretanha) , assim como os paises que sofreram influência desses povos, tais como os EUA e o Canadá (em sua região Norte). Confunde-se muitas vezes a new age com a música celta, mas o fato é que esse estilo tem muito pouco em comum com a música tradicional. A música tradicional celta é composta por danças tais como as reels, as jigas, valsas, marchas, entre outras, que podem ser tocadas por violinos, acordeons, flautas, whistles (espécie de flauta irlandesa) , banjo (usado mais nos EUA) , gaitas de foles, bodhran (instrumento de percussão) , etc. Existem também canções e baladas cantadas acompanhadas pelos instrumentos citados.
Quando perguntei a um gaiteiro da Bretanha o que era música tradicional celta, ele respondeu: “A música vem principalmente de uma região remota da Grã Bretanha. Os bretões (franceses) vieram do sul da Escócia (estreito de Clyde) , de Lancashire, e do país de Gales. Assim todos esses povos mantiveram influências em comum. A música continuou em alguns aspectos alheia à influência moderna. Porem 95% da música consiste de influencia pós –barroca”.
Gaita-de-Foles: O instrumento mais comumente associado ao mundo celta é a gaita-de-foles. Porém o instrumento foi pela primeira vez tocado no Oriente Médio, espalhando-se mais tarde por quase toda a Europa. Por isso não se espante se você encontrar gaiteiros em paises nada célticos como a Bulgária ou Hungria, pois a gaita de foles era (ainda é) um instrumento muito comum e cada cultura a utiliza de seu próprio modo.
Música dos paises nórdicos: A música dos países de cultura viking (Dinamarca, Suécia, Noruega e Islândia) consiste de danças como a polska (polca) e o schottish entre outras. Nos dias de hoje utiliza-se muito o acordeon e o violino, porém instrumentos mais antigos como a gaita-de-foles e a harpa de boca (que produz um som parecido com o de uma mola!) ainda estão presentes na música folclórica desses países. Os finlandeses por terem origem fino-ugrica possuem cultura diferente dos demais paises nórdicos. A música do país é dividida em duas épocas; a antiga ou Kalevala (esse nome refere-se a saga épica dos finlandeses) em que eram utilizados o Kantele (espécie da harpa finlandesa) e o jouhikko (espécie de lira tocada com arco) ; e a época chamada “palimanni” em que a utilização do violino e de danças oriundas de outras partes da Europa (como a polca que tornou-se a Humppa finlandesa) são marcantes.
Música da Idade-Média: refere-se no inicio a músicas de cunho religioso como o canto gregoriano, que surgiu entre 750-850 d. c. provavelmente de origem romana, e acabou tornando-se o canto oficial da igreja católica. No século 14 com o surgimento do movimento “Ars Nova” foi introduzido o contra-ponto (sobreposição de melodias) à música. Da produção de música secular (não religiosa) na idade media destaca-se a música dos trovadores e as canções da obra imortalizada pelo compositor Carl Orff “Carmina Burana”.
Bandas de Folk Metal
Podemos considerar as bandas de folk rock do final dos 60, tais como o Fairport Convention, Steeleye Span, Albion Band como os avós do folk metal, pois foram eles os primeiros a colocarem guitarras baixo e bateria, enfim colocar certo peso na música folk, porem somente vinte anos após foi que o folk-metal surgiu. Vou procurar aqui apresentar algumas bandas que não somente apresentam letras ou alguns riffs que lembram música folclórica e (ou) medieval e sim tentar mostra o lado mais “folk” possível do metal para esclarecer melhor essa simbiose, e quem sabe despertar o interesse pela música medieval e folclórica nos ouvintes de metal. Ai vai a lista:
Skyclad: Os pioneiros do folk metal surgiram em 1990 quando dois integrantes da banda de metal tradicional Pariah, Steve Ramsey e Greame English) juntaram-se com o vocalista do Sabbat (banda de thrash). Logo no primeiro play da banda os rapazes incluíram duas faixas com a presenca de um violinista. Essas duas faixas tornaram-se então as músicas que mais chamaram a atenção do publico, fato que fez com que a banda contratasse uma violinista fixa. Apesar de o Skyclad ser considerado o pioneiro do folk metal suas influencias vão muito alem da música celta. Alem disso ao contrário da maioria das bandas do gênero as letras do Skyclad têm enfoque voltado para problemas políticos e assuntos pessoais.
Site oficial: www.skyclad.co.uk.
Ragnarok: Chefiados pelo baixista, vocalista e desenhista de iluminuras saxãs Deörph (que na verdade se chama Martin) o Ragnarok (UK) chegou a ter um certo reconhecimento por aqui com o álbum “Domgeorn” lançado pelo Rock Brigade Records. A banda toca um black metal com influência da música celta e da música dos antigos saxões da Inglaterra. Os caras inclusive cantam na língua saxã que a muito tempo caiu em desuso. A gravadora vem prometendo o terceiro álbum do grupo faz um bom tempo mas até agora, só ficou na promessa.
Cruachan: Banda da Irlanda, que utiliza instrumentos como o whistle, o bódhran, harpa e o bazouki (um instrumento grego mas que também é utilizado na música irlandesa e escocesa). O Cruachan é uma das bandas em que a influência da música celta fica mais “na cara”. Os caras utilizam muitas vezes melodias tradiconais (como a marcha de Brian Boru) e as transformam no nosso conhecido heavy metal.
Site oficial: www.cruachan.cjb.net.
Subway to Sally: Banda alemã fundada em 1992. Os caras têm uma grande legião de fãs em seu país natal mas é desconhecida por aqui. Nos primeiros plays a banda era bem voltada para a música celta e cantava em inglês. Depois de alguns anos eles incorporaram influência de música medieval e colocaram muito mais peso no som, alem disso agora eles cantam apenas em alemão.
Site oficial: www.subwaytosally.com.
In Extremo: Outra banda alemã, o In Extremo pega canções e danças medievais e injeta uma mistura de punk e metal. Eles lembram bastante a última fase do Subway to Sally porem utilizam músicas tradicionais (sejam norueguesas ou anônimas medievais) com mais ênfase do que o Subway To Sally. O In Extremo não é uma banda completamente desconhecida por aqui. Sem muita dificuldade você encontra cds dos caras na galeria do rock em SP.
Site oficial: www.inextremo.de.
Schandmaul: Para fechar a trinca de bandas folk metal da Alemanha temos esta que segue a linha dos outros dois somente, talvez um pouco mais comercial.
Site oficial: www.schandmaul.com.
Bran Barr: Representante do folk metal na região “céltica” da Bretanha. Apesar da banda ser radicada em Paris, os caras fazem uma mistura de metal extremo com a música da Bretanha. Usam instrumentos como o bombarde (instrumento em forma de corneta que produz um som estridente, muito usado nas bandas folclóricas da Bretanha) e o bodhran.
Site oficial: www.membres.lycos.fr/branbarr.
Elvenking: Os italianos do Elvenking são relativamente famosos por aqui. Os caras tocam um heavy metal melódico com algumas influencias celtas. O ex-vocalista do Skyclad Martin Walkyier irá participar em algumas faixas do novo álbum da banda, que contará também com a presença de um novo vocalista (Kleid) substituindo Damnagoras, e um tecladista/violinista fixo (Elyghen).
Site oficial: www.elvenking.net.
Mago de Öz: Banda de Madrid (Espanha). Toca também um heavy melódico usando flautas e violino.
Site oficial: www.inicia.es/de/MagodeOz.
Tuatha de Danann: O representante do Brasil no estilo tem características muito peculiares. A parte folclórica da música dos mineiros do Tuatha é muito difícil de se identificar, não lembrando muito nem a música celta nem medieval. De qualquer forma o som é bem original e interessante. A banda também é a única do estilo que utiliza a flauta-doce (instrumento bastante usado na música medieval). Já lançou dois álbuns.
Site oficial: www.tuathadedanann.cjb.net.
Finntroll: Os finlandeses do Finntroll surgiram em 97 quando resolveram juntar a energética humppa (espécie de polca finlandesa) com metal extremo. As letras da banda contam estórias de trolls atacando cristãos, trolls explodindo uma sauna finlandesa, etc. Viajem pura! Outro aspecto interessante é que apesar de a banda ser finlandesa as letras são em sueco (idioma completamente diferente do finlandês). A explicação para isso é que na verdade uma parte dos finlandeses que vivem nas regiões próximas a Suécia também falam sueco.
Site oficial: www.finntroll.net.
Storm: As pessoas por trás dessa banda são Fenriz do Darkthrone e Satyr do Satyricon. A banda toca canções tradicionais norueguesas com uma roupagem metal.
Otyg: Os suecos do Otyg começaram em 1995 como uma celebração da antiga música folclórica Escandinava. Eles utilizam violino e também a harpa de boca. Em sua formação o Otyg apresenta dois integrantes da banda Vintersorg, o próprio Mr. V (apelido de vocalista) e o guitarrista Mattias Marklund. Infelizmente depois de ter lançado dois ótimos álbuns (Älvefärd e Sagovindars Boning) Mr. V resolveu colocar o grupo “na geladeira” para se dedicar a seu (também excelente ) trabalho solo, com letras e sonoridade mais voltadas para o ramo matemático metafísico (apesar de seus primeiros play solos terem uma certa linha folk).
Metsatöll: Banda da Estonia (país localizado na região do Mar Báltico). A banda mistura (reparem que não é a primeira vez que utilizo essa palavra nesse artigo!) um heavy épico agressivo com cantos xamanisticos dos habitantes pré-teutonicos da antiga Estonia.
Site oficial www.metsatoll.ee.
Balkandji: Banda muito curiosa que vem da Bulgária (conhece alguma banda de metal ou ate mesmo de rock de lá?). Junta o heavy metal com a riquíssima música tradicional búlgara. A música tradicional da bulgária destaca-se pelo seus tempos muito quebrados, 7/8, 11/8, fazendo os fãs de Dream Theater se morderem de inveja. Apesar da produção das músicas da banda ser meio “tosca”, é muito interessante. Confira alguns mp3s no site abaixo.
Site oficial: www.balkandji.com.
Vou colocar aqui alguns links para quem quiser pesquisar um pouco mais o “mundo folk” e a música medieval:
www.members.shaw.ca/chieftains: site oficial dos “papas” da música tradicional irlandesa. Os Chieftains de Paddy Maloney foram um dos responsáveis pelo “revival” da música celta em meados dos anos 60.
www.tannahillweavers.com: site de uma das melhores bandas de celta escocesas, o Tannahill Weavers, que mesmo sem guitarras conseguem soar mais “heavy” do que muita banda de metal por aí.
www.milladoiro.com: site oficial da Milladoiro, banda da “nação celta” Galicia. Fazem um apanhado de músicas irlandesas juntamente com músicas tradicionais galegas (como as muñeiras).
www.faust.just.nu: site da banda “Faust!”. Música sueca antiga usando vários tipos de gaitas-de-foles, bazouki, violino entre outros instrumentos. Imperdível pare quem curte as bandas de folk metal dos paises nórdicos!
www.corvuscorax.de: Apesar do visual um tanto excêntrico e da atual fase da banda ter enveredado pelos caminhos um tanto tortuosos da música eletrônica, os alemães do Corvus Corax são um bom meio de começar a ouvir a música genuinamente medieval.
www.thesession.org: Esse site serve para que pessoas que (assim como eu) tocam violino (ou outro instrumento que utilize a clave do sol) e querem tocar umas músicas tradicionais irlandesas e escocesas.
www.rootsworld.com: Site da revista de world music Roots World com reviews e lançamentos de bandas tradicionais de todo mundo.
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