22 de janeiro de 2011

Crônica do Amor Louco - Storie di ordinaria follia




Sinopse
Serking é um poeta beberrão e anárquico que vive na cidade dos anjos perdidos, entre prostitutas e marginais, no submundo de Los Angeles. Ele é um individualista, acha que estilo é tudo na vida e vive desregradamente, produzindo histórias que cheiram a sexo e álcool e não faz esforço para agradar ninguém. Numa de suas maratonas pelos bares, conhece Cass, uma linda e autodestrutiva prostituta e inicia um romance repleto de amargura e tragédia.


Tesão pela vida: A Historia de Iggy Pop - Parte 05

Iggy Pop procurou se manter quieto, aparecendo pouco, em uma fase que ele chamou apenas de "descanso". Ocasionalmente visitava Williamson que vivia em Detroit, e acabou compondo "Penetration" que foi, segundo Iggy, a faísca inicial para começar a compor e vislumbrar uma nova banda, criada em torno de James Williamson. Iggy tinha plena noção que não havia como crescer em Detroit, e precisava sair de lá se desejasse uma banda com exposição nacional e, na melhor das hipóteses, internacional. Foi quando surgiu uma proposta para ele ir para Miami.


Iggy Pop Sem os Stooges
Em agosto de 1971, Iggy recebeu uma oferta de Steve Paul, empresário de Edgar e Johnny Winter. Steve queria que Iggy voasse para a Flórida e começasse a montar um grupo com Rick Derringer e alguns músicos. Sua intenção era de ter Iggy como homem de frente de uma banda montada com músicos sobre seus cuidados. Iggy percebeu de longe a intenção de amarrá-lo a um esquema onde ele provavelmente não teria controle sobre o trabalho. Mesmo assim, em parte como cortesia, em parte por curiosidade, Iggy foi conhecer Rick Derringer, passando uma tarde com ele falando sobre música.
Iggy diria "Eu gostei de Rick como pessoa e o respeito como músico pelo tipo de trabalho que ele faz. Mas eu logo percebi que a química não estava certa. Ele é um ótimo músico, porém sua visão estava em outro lugar e a minha visão era a minha, portanto eu declinei".
Iggy também recusou uma proposta que surgiu, por parte da Elektra, para produzir um álbum solo com o que a gravadora chamou de "músicos de verdade" e com canções que Iggy descreveu como "no estilo de David Cassidy" (The Partridge Family/A Familia Do-Re-Mi). Iggy resolveu então arriscar uma ida até Nova York para ver se arranjava algo, mas para chegar até lá precisou pedir inúmeras caronas pelo caminho. Chegando, ficou hospedado no apartamento de Danny Fields e de Gerald Malanga. Os dois não tinham nada para oferecer profissionalmente a Iggy que, a esta altura, chegou a cogitar seriamente em abandonar a música. E foi por um golpe de sorte que as coisas começaram a melhorar para ele.
O Teatro do Ridículo
Enquanto isto se passava na Flórida, paralelamente em Londres, Tony Zanetta conheceu David Bowie no dia 2 de agosto 1971, após uma apresentação de "Pork", do Andy Warhol. A peça foi escrita e dirigida por Tony Ingrassia, e seu enredo é basicamente sobre uma pessoa que passa o dia usando drogas injetáveis e conversando ao telefone, sendo que todo o resto gira em torno deste personagem, e Zanetta fazia o papel de Andy Warhol. O texto foi todo montado ao redor de conversações pelo telefone que Warhol teve com diversas pessoas e que ele gravara. Warhol depois entregou as fitas para Ingrassia que pincelou e costurou tudo em um formato de peça.
Bowie, que estava realizando algumas apresentações no Hampstead's Country Club, viu a peça, assim como vários integrantes do elenco da peça foram assistir Bowie, ainda desconhecido na América. Ele já tinha uma imagem de andrógino, que foi o que atraiu o pessoal do Pork para assistir o show. Mas todos ficaram desapontados vendo a interpretação da imagem de androginia na Inglaterra sendo um pouco diferente da de um hippie cantando folk com um violão sentado em um banquinho.
O pessoal do teatro estava com cabelos coloridos e com unhas e batom preto, coisa impensável de se usar e totalmente escandalosa. Quando Bowie anunciou a presença dos artistas na platéia e pediu para que se levantassem, Cherry Vanilla tirou sua peruca e mostrou os peitos. Foi um choque para alguns e engraçado para outros. Quase um ano depois, David Bowie acabaria compondo com Lou Reed a canção "New York Conversation" inspirado nesta peça. Todo o elenco de Pork, incluindo Zanetta, ficou amigo de David e Angela Bowie.
Max's Kansas City
Danny Fields foi a um jantar com Dennis Katz, chefe da gravadora A&M, que fazia parte da RCA. No jantar estavam presentes Tony Zanetta, Lou Reed, Mick Ronson, Tony DeFries, mais David e Angela Bowie. Bowie e DeFries haviam chego para fechar o contrato negociado com a gravadora RCA. Nesse jantar, Bowie chegou para Fields e disse que gostaria de conhecer Iggy Pop. Rapidamente, Danny ligou para sua casa e mandou que Iggy fosse imediatamente para o Max's Kansas City, local do encontro.
Iggy conta sua reação: "Eu estava na casa de Danny assistindo 'Mr. Smith Goes to Washington', na televisão e quase dormindo, quando Danny me ligou perguntando se eu lembrava de David Bowie, que tinha dito anos atrás à Melody Maker que eu era seu cantor favorito. Disse que sim e ele mandou pegar um táxi imediatamente e ir até o Max's Kansas City. Eu disse que ia, mas não consegui sair de casa, porque entrei em lágrimas vendo a fantástica performance de Jimmy Stewart no filme da televisão. Danny ligou novamente furioso e mandou que eu fosse até lá. Obedeci e fui correndo. Quando cheguei, Bowie e DeFries me convidaram para um café da manhã, e eu estava tão faminto que comi seis refeições e ficamos conversando por horas e horas".
Iggy Pop, Jackie Curtis e Lou Reed no Max
Iggy Pop, Jackie Curtis e Lou Reed no Max

Bowie tem outra versão: "Eu estava em uma festa da RCA no Max's Kansas City e tinha acabado de conhecer Lou Reed. Ele imediatamente passa a me contar uma história de um cara que tinha injetado herô na testa, uma coisa tipicamente dele de dizer. De repente, chega esse maltrapilho engraçado com um dente quebrado e Lou falou, 'não converse como ele, ele é um junkie.' Tratava-se de Iggy. Você não conseguia deixar de ser atraído por ele. Ele era tão vulnerável".
Danny Fields lembra-se bem da primeira vez que percebeu a paixão de Bowie por Iggy: "Sempre que alguém ia me visitar na Elektra fazia a mesma pergunta: 'oh, me fale algo de Jim Morrison, oh, eu amo tanto os Doors!'. Pois David foi o único que chegou a mim e disse 'me fale sobre Iggy'".
Bowie, neste ponto de sua carreira, não era ninguém na América e representava quase nada na Inglaterra. Ele tivera apenas um sucesso mediano no Reino Unido com "Space Oddity" em 1969 e mais recentemente, a canção "Changes", de sucesso também moderado, e mais nada. Ambas seriam redescobertas após o estrondoso sucesso de seu próximo álbum e sua nova imagem. Mas naquele momento sua carreira ainda buscava direção. A imagem nova, aqui ainda não aperfeiçoada, seria em larga escala baseada no que ele absorvera destes travestis nova-iorquinos que conhecera em Londres apresentando a peça Pork. Quando Bowie foi para Nova York para a assinatura de contrato com a RCA, foi justamente com estas pessoas que ele procurou se encontrar.
Iggy Pop por sua vez, naufragando em Nova York no final de 71, estava freqüentando o bar e restaurante Max's Kansas City, ponto underground chic e reduto favorito de artistas de todas as esferas. A opção de um homem em ser um travesti, embora não fosse algo inteiramente novo, principalmente na Europa, era ainda para os Estados Unidos, um país sexualmente repressivo, algo inconcebível para a sua população em geral.
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Intrigado por este povo extremamente, ou melhor, sexualmente alternativo, Iggy podia ser visto conversando com toda esta turma, que tinham entre eles, nomes hoje conhecidos como Holly Woodlawn, Candy Darling, e Jackie Curtis, todos mencionados na canção "Walking On The Wild Side" de Lou Reed. Iggy também estava absorvendo um pouco da criatividade destas pessoas que escolhiam, digamos, serem diferentes do padrão. Lou Reed, que igualmente estava tentando reiniciar sua carreira apos o fim do Velvet Underground, igualmente estava sendo influenciado por este grupo de pessoas com quem encontrava religiosamente no Max's Kansas City.
Leee Childers Black, analisando a carreira destes artistas, comentaria que tanto Iggy quanto Bowie estavam artisticamente sem direção e quando se encontraram, acabaram salvando um ao outro. De uma tacada só, Bowie conheceu dois de seus maiores ídolos, Reed e Pop. Bowie tinha adorado os dois discos dos Stooges e se impressionado com a apresentação de Iggy no Festival de Cincinnati, que havia sido transmitido na televisão da Inglaterra. Aliás, Bowie confessaria mais tarde que a fórmulação de seu personagem Ziggy Stardust ficaria completa após assistir um show de Iggy Pop.
MainMan
As mentes de Bowie, Iggy e DeFreis engrenaram harmoniosamente neste primeiro encontro no Max's Kansas City, que terminou com um café da manhã no restaurante do Warwick Hotel. O papo e troca de idéias artísticas virou a noite e David convenceu Iggy a assinar com Tony DeFries. Mas para isso Iggy precisaria estar limpo, ou seja, livre da dependência de heroína.
Assim que Iggy estivesse totalmente livre da metadona (usada contra a dependência da heroína), DeFries iria arranjar um contrato e uma viagem até Londres para montar uma banda e gravar um disco. DeFries queria que o disco fosse gravado na Inglaterra de qualquer maneira, já que a reputação de Iggy e os Stooges era a pior possível na América. A intenção de DeFries e sua firma, a MainMan, girava em torno de Iggy Pop, já que ninguém queria saber dos Stooges.
Bowie tinha dado como sugestão associar Iggy à banda inglesa Third World War (não confundir com a banda Américana World War Three), que era liderada por Edgar Broughton. Como Iggy temia ser obrigado a cantar as composições de Broughton, rapidamente rejeitou a idéia, alegando que queria trabalhar com seu guitarrista James Williamson. DeFries imediatamente se viu obrigado a incluir Williamson em seus planos, que por sua vez estava com hepatite, devido ao uso de seringas sujas, em Detroit. Tanto Iggy quanto James estavam desesperadamente procurando resolver seus problemas com a dependência de heroína fazendo tratamento com metadona.
CBS
Praticamente no dia seguinte DeFries conseguiu um lucrativo contrato de dois discos para Iggy com Clive Davis, da CBS. Sabendo que o encontro entre o diretor da gravadora e o artista seria de extrema importância, DeFries incutiu em Iggy o espírito de que era a hora da verdade em termos de sua carreira futura. Orientou-o também para o fato de que Clive Davis era o tipo de homem que iria gostar de conhecer um rapaz bonito e inteligente.
Iggy lembra da entrevista para assinarem o acordo da seguinte maneira: "Clive Davis pediu para que eu cantasse algo de Simon and Garfunkel, mas recusei. Perguntou se poderia ser mais melodioso e respondi que não. Ele me pediu então para cantar algo, então mandei bala em 'The Shadow Of Your Smile', depois sapateei um pouco no estilo 'soft shoe' e Clive disse 'ok, ok, é o bastante'. Então ele ligou para o departamento jurídico. Eu tinha conseguido um contrato".
Steve Harris e Iggy Pop
Steve Harris e Iggy Pop

Steve Harris, que promovia os discos dos Stooges para Elektra dois anos antes, trabalhava agora para a CBS como vice-presidente. Ao ser procurado por Clive Davis a respeito do novo contratado, Harris destaca para o diretor a necessidade de promover Iggy Pop da forma correta, pois, segundo suas palavras, "ele não é nenhum Barry Manilow".
Animado, Iggy voltou para Ann Arbor e contou as boas novas para o amigo James Williamson, e começam a planejar um novo grupo. Os dois estavam mais íntimos do que nunca, pelos problemas em comum com as drogas. Em uma festa promovida por Scott Richardson no estúdio do SRC, Ron Asheton encontra com Iggy e Williamson depois de muitos meses. Somente agora é que ele fica sabendo que os dois estão a caminho de Londres e com um contrato com a CBS. Ron conta: "Foi como se alguém tivesse me dado um soco na boca do estômago. Eu sempre achei que eventualmente a gente acabaria voltando a tocar juntos novamente. Eu saí de lá zonzo, abraçei uma árvore e chorei por meia hora. E a maneira tão casual que ele me contou; 'Aliás, consegui um contrato, James e eu vamos para Inglaterra.'"
Em dezembro daquele ano, DeFries voltou para Nova York, seguindo então para Ann Arbor acertar os detalhes para a viagem trazendo Iggy e Williamson com ele para Nova York, onde se hospedaram no hotel Warwick. DeFries deu US$ 500 para os dois e contratou Zanetta para cuidar do cantor, enquanto ele DeFries cuidava de fazer alguns contatos.
Nova Carreira em Nova Cidade
Keith Moon & Iggy Pop
Keith Moon & Iggy Pop

Desta forma, o ano de 1972 começou para Iggy e James da melhor maneira possível. Teoricamente livres da dependência química e morando em Londres, tudo que faziam era ensaiar, ensaiar e ensaiar. Os dois foram colocados inicialmente no hotel Royal Gardens, mas para diminiuir as despesas foram relocados para uma pequena casa em St. John's Wood. Durante os meses de abril e maio, os dois testaram vários músicos para o grupo, procurando um baixista e um baterista. Uma das primeiras experiências foi com Trevor Bolder e Woody Woodmansey, a cozinha da banda Rats, que se tornariam The Spiders From Mars. Depois vieram Twink Alder, baterista conhecido no circuito com passagens por bandas como The Fairies, Tomorrow e Pink Fairies. Com ele veio Overend Watts, do Mott the Hoople, que também ensaiou com o pessoal, mas nenhum deles se mostrou agressivo o suficiente para o gosto musical de Iggy e de James. No fundo, eles queriam era encontrar alguém com o som de Detroit, algo que simplesmente não existia em Londres.
James lembra que quanto mais testavam, mais desanimados ficavam, até que decidiram ligar para Ann Arbor e convidaram Ron e Scott para irem até a Inglaterra. Segundo se conta, James comentara que não iriam encontrar um baterista tão violento quanto Scott Asheton e Iggy rapidamente concluiu que se fosse para chamar um, seria melhor chamar os dois. Scott adorou a idéia, mas Ron, não. "Então Iggy me liga dizendo que não encontrou ninguém bom suficiente (por lá) para tocar baixo e bateria. Valeu cara, vocês foram para outro lugar, não me convidaram e agora porque estão desesperados, precisam da minha ajuda, então me ligam?"
Além do mais, Ron não queria tocar baixo e sim guitarra. Mas ir para Inglaterra era melhor do que continuar parado em Ann Arbor morando com a mãe. Ron queria fazer alguma coisa. Qualquer coisa. E o convite de remontar os Stooges agora sob patrocínio de uma produtora inglesa era uma ótima opção. Sobre a MainMan, Ron comentaria, "Nós éramos tratados muito bem, porém de forma diferente. (O contrato com)Mainman não era com a banda, era com Iggy. Ele que assinou e tomou para si a responsabilidade pela criação (dos Stooges). Nós eramos apenas os ajudantes odiosos do monstro que ele criou".
Os dois irmãos chegaram no dia 6 de junho de 1972, e logo conheceram David Bowie, a esta altura já uma grande estrela, que apareceu na casa com duas jamaicanas. Ao ir embora, Bowie supostamente agarrou a bunda de Ron Asheton e lhe deu um beijo. A reação instintiva de Ron foi armar o braço para lhe aplicar um soco na cara, mas não o soltou. Sabiamente lembrou que se tratava de David Bowie, um artista e sócio da MainMan, firma que pagou sua passagem e o aluguel da casa que ele agora reside. No dia seguinte começaram a ensaiar, geralmente trabalhando entre meia-noite e seis da manhã.
The Stooges em Londres
No começo de junho de 1972, "The Fall And Rise of Ziggy Stardust And The Spiders From Mars" foi lançado, e é justamente por causa de Ziggy Stardust que DeFries não se arriscava em marcar um show para o grupo de Iggy, temendo que uma atração tirasse atenção da outra. Com os Stooges montados novamente, Ron e Scott finalmente dando a Iggy e James o peso que eles tão desesperadamente desejavam, passam a ensaiar intensamente o novo material composto por Iggy e James. Aliás, uma das grandes mudanças desta versão dos Stooges em comparação com a antiga era a facilidade com que Iggy e James conseguiam criar, montar e estruturar uma canção nova.
James Williamson
James Williamson

James Williamson não só era um guitarrista mais virtuoso do que Ron Asheton, mas tinha uma enorme facilidade para estruturar uma idéia musical em uma canção. E Iggy rapidamente aprendeu com Williamson como compor uma letra que encaixasse nesta estrutura musical montada, até que, em pouco tempo, os dois estavam compondo juntos, em verdadeira parceria. Iggy e James centralizavam todo o trabalho de composição e não permitiam que Ron e Scott opinassem. Apesar disso, Ron anos depois acusaria os dois de usarem idéias sugeridas por ele embora nunca cedendo-lhe crédito. Nem mesmo um obrigado.
Havia brigas entre Ron e James, o baixista acusando o guitarrista de arrogante por tratarem a cozinha da banda como músicos contratados durante os ensaios, e não como integrantes de um grupo. No entanto, James Williamson era tambem o mais violento e o melhor lutador entre eles, a ponto de até Scott Asheton se sentir intimidado por ele. Neste clima, os irmãos Asheton assumiram o lugar de coadjuvantes em uma banda que ambos achavam que eles haviam criado, afinal, para os irmãos Asheton, The Stooges foi uma extensão natural do The Dirty Shames, com Iggy substituindo a irmã Kate Asheton nos vocais.
Sobre a mão de Iggy e James, a banda trabalhou duro durante semanas, ensaiando todos os dias da semana até estarem coesos, sólidos como uma boa banda precisa ser. Sem drogas pesadas, só fumo (haxixe trazido semanalmente à casa) e um pouco de birita, pode-se cogitar que, possivelmente, o melhor momento musical do novo Stooges nunca foi visto ou gravado. Ensaiaram tanto sem terem nada marcados que quando a MainMan mandou o fotógrafo Mick Rock para registrá-los, ele encontrou um grupo extremamente cooperativo. Deram toda a atenção ao fotógrafo, simplesmente porque estavam entediados ao extremo e era uma coisa nova e diferente acontecendo.
A estréia ao vivo de Ziggy Stardust and the Spiders From Mars foi no Rainbow Theatre, onde os Stooges e Lou Reed foram convidados de honra para assistir. Tendo assistido o ensaio geral à tarde, de noite, durante o primeiro terço do show, Ron e Scott levantam e vão embora, entediados. Foram até o bar do teatro onde encontraram Lou Reed, já embriagado. Os três enchem a cara e Reed, ainda por cima, oferece um Mandrax para cada um e terminaram a noite ali mesmo no bar. No dia seguinte, Ron e Scott foram chamados ao escritório da MainMan, com Tony DeFries dando um esporro por terem abandonados os seus lugares à vista de todos na terceira música do show. Ron mandou Tony para aquele lugar e este seria o perfeito exemplo de como andariam as relações entre DeFreis e os Stooges, no futuro.
Show No Scala
Aquele era um tipo de público. Pareceu bem mais velho.

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Tony "importou" alguns jornalistas dos Estados Unidos para assistirem um show de Bowie no Aylesbury Park em Londres, marcado para o dia 15 de julho. Após o show, foram colocados em um ônibus à disposição para assistirem uma apresentação do reformado Stooges em Pentonville Road perto de King's Cross. O local era um velho cinema poeira chamado The Scala, agora sendo usado como casa de espetáculo. Este é o mesmo local onde Lou Reed havia feito uns shows, dias antes. Acabaria sendo o único show da banda na Inglaterra, na Europa, como também, o único no ano de 1972.
The Flamin' Groovies abriram a noite começando sua apresentação pouco depois de meia noite, seguidos então pelos novos Stooges. Os críticos ingleses só conheciam Iggy e Stooges de nome e sua reputação de doidos. Iggy entra no palco usando uma calça prateada lamé e cabelo loiro, mais selvagem do que nunca. Com uma performance maluca e insana, chamou e grudou a atenção dos presentes. Após uma apresentação de 40 minutos, onde só tocaram canções novas - "Gimme Some Skin", "I Got A Right", "I Need Somebody", "I'm Sick of You", e "Scene of the Crime", ou seja, nenhuma de seus dois álbuns pela Elektra. Quando o microfone teve uma pane, Iggy não se abalou e fez uma versão muito bem humorada de "The Shadow Of Your Smile", imitando Frank Sinatra, que a havia gravado.
A casa estava bastante cheia e praticamente todos saíram de lá embasbacados ou chocados. A grande maioria do público era composta por pessoas na casa dos 30 anos e não adolescentes, sendo a maioria de jornalistas ou de gente que trabalhava no meio. Como de costume, primeiro a banda e depois Iggy vêm ao palco, com o cantor encarando o público, analisando-o antes de começar a cantar. Nesta noite ele roda por todo o palco, olhando fixamente às pessoas presentes, todos sentados em suas poltronas de cinema. Quando finalmente chega ao microfone, insulta todos, dizendo que não sente inspirado pela platéia. Nick Kent, do jornal New Musical Express, diria em seu review, "O efeito era mais assustador do que todos os discos de Alice Cooper e o filme Laranja Mecânicas somados". Hoje, ouvindo um disco como "Raw Power", ele soa até melódico; mas naquela época não havia nada que chegasse perto da agressividade da música que os Stooges estavam tocando.
Iggy comentaria assim sobre aquela noite, "Aquele era um tipo diferente de público. Pareceu bem mais velho. Eu gostaria de provar (aqui na Inglaterra) um público verdadeiramente adolescente. Eu vi várias meninas bonitas na platéia. Eu vi algumas meninas realmente lindas andando por Londres, mas parece que eu nunca consigo conhecê-las".
Dorchester Hotel
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No dia seguinte, MainMan marcou uma entrevista coletiva no suntuoso hotel Dorchester, em Londres, com David Bowie, Iggy Pop (vestido com uma camiseta do T. Rex) e Lou Reed. Lou Reed estava acabando de gravar o álbum "Transformer", sobre os auspícios de Bowie. O mesmo se esperava acontecer em relação ao novo álbum que Iggy Pop iria começar a gravar. Pelo menos estes eram os planos da MainMan.
David Bowie, fazendo as honras como anfitrião, apresenta Iggy para os jornalistas, definido sua imagem de imprevisível como um artista que possui um dom teatral natural. "É algo todo seu, um teatro de Detroit que ele traz consigo, e que vem diretamente das ruas". Concluindo, Bowie elogia Iggy dizendo que ele possuía todo o gestual teatral necessário de uma grande estrela. Sobre Lou Reed, Bowie diria: "Qualquer sociedade que permite pessoas como Lou e eu a se tornarem estrelas, está realmente perdida".
A entrevista foi um happening, embora para apenas uma dúzia de jornalistas ou pouco mais, e foi realizada durante a hora do chá, com o evento sendo servido de champagne, caviar e morangos frescos. David Bowie, Lou Reed e Iggy Pop fizeram cada um, uma versão teatral de si mesmo para a mídia. Iggy era o junkie, Lou Reed era o americano sarcástico atraído pelo anfitrião, Bowie, que nesta tarde era a duquesa desta corte. Era um teatro totalmente estruturado acontecendo na vida real.
Angela Bowie anos depois, comparando as diferenças entre Iggy Pop e Lou Reed, diria: "Suponho que Lou era um pouco mais sofisticado do que Iggy, porém, onde Lou Reed não fez a leitura, Iggy leu de tudo. Os pais do Iggy eram professores de escola, e ele realmente leu Dostoievsky e todas aquelas merdas. Lou tinha aquela onda Nova Yorquina, onde ele fazia como se tivesse lido mesmo não tendo. Ele entrava na conversa cobrindo aspectos de um dado assunto superficialmente de uma forma que você não ficava com dor de cabeça ao final do papo. Com Iggy, caso você se aventurar a ter uma conversa realmente seria com ele, Iggy te mostraria que você é um ignorante e burro e que ele era esperto e afiado feito um chicote. Uma vez isto tenha sido dito e estabelecido, ele vai passar a te usar de todo modo possivel para comer, arrumar drogas, ou conseguir enrabar alguém".
Concebendo Raw Power
Passada a noite de show e entrevistas, Iggy e os Stooges voltam aos ensaios, sem data marcada para outro show ou iníio das gravação do prometido disco. A MainMan, ocupada demais com David Bowie, não dava sinal verde para os Stooges, pois temia o perigo de uma banda tirar o brilho da outra. Os eternos ensaios passam a ter seu propósito questionado e o tédio passa a tomar conta. Uma coisa que ninguém fala sobre aquele único show dos Stooges em Londres é que a vizinhança era ponto para prostituição e venda de narcóticos. Assim, naquela noite, os Stooges descobrem onde comprar heroína em Londres quando quiserem.
Apesar de serem proibidos pela MainMan de usarem drogas, Iggy e James, seguidos por Scott, voltariam a usar heroína. Iggy havia se esforçado muito em realizar um bom trabalho e vendo DeFries como seu salvador artístico. Mas, com o sucesso de David Bowie, a MainMan insistia em segurar Iggy & os Stooges, não permitindo a eles nenhuma exposição. A rotina de ensaios sem propósito começou a deprimir todos, o que inevitavelmente levou os músicos a buscarem prazeres externos.
A banda então foi autorizada a registrar uma demo do material que seria preparado para o novo disco e uma audição da tal fita foi realizada na MainMan. Marcharam todos para o RG Studios, em Wimbledon, onde gravaram a grande demo para a produtora, que apareceria posteriormente em vários discos piratas dos Stooges. O repertório desta demo é, em essência, o disco a ser lançado como visualizado pelos Stooges, com as canções "Scene of the Crime", "Hard To Beat", "I Got A Right", "Gimme Some Skin", "I Need Somebody", "I'm Sick Of You", "Nigger Man", "Fresh Rag", "Tight Pants", e "RG Jones At Wimbledon".
O disco estava mais ou menos montado na cabeça dos dois compositores até mostrarem para DeFries, que odiou todo o repertório. Furioso, mandou que escrevessem novas canções, dizendo-se envergonhado com aquele material. DeFries havia gostado apenas dos riffs de "RG Jones At Wimbledon" e "Tights Pants", que depois de ter a letra alterada virou respectivamente "Search And Destroy" e "Shake Appeal". Mas DeFries não sabia o que fazer com Iggy e com sua falta de cooperação.
Estava óbvio que deixando o disco em sua mão, MainMan jamais teria um produto comercialmente viável. DeFries então pede a Bowie que tente negociar com Iggy uma forma de "ajudar" na realização do novo disco. Mas Iggy dispensa a ajuda de Bowie também, não querendo que se faça com os Stooges a mesma estratégia feita com Mott The Hoople, grupo que ganhou uma composição exclusiva do Bowie - "All The Young Dudes" - que tocou bastante nas rádios, empurrando as vendas do álbum, além de ajudar consideravelmente a vender ingressos para seus shows. Iggy simplesmente não queria desvirtuar seu sonho musical para acomodar uma fórmula popularesca e também não queria abrir mão do controle de todo o álbum. Então, David Bowie retornou a DeFries aconselhando-o a simplesmente deixar Iggy fazer o que quiser.
As Canções
Sobre as canções, "Death Trip", propositalmente colocada como a última do álbum, seria diretamente relacionada com a recusa de DeFries do material original para o disco oferecido na fita demo. "Eu sabia que o álbum estava predestinado ao fracasso, que a nossa relação com a MainMan estava predestinada ao fracasso. Eu sei que eu estou predestinado ao fracasso por lançar música assim, pois sei que ninguém vai promovê-la. Sei que não vai tocar nas rádios e um monte de gente não irá gostar dela. Mas por outro lado, estou totalmente convencido que esta é a melhor música, portanto é isto que eu vou fazer. É sobre isto que eu estou cantando".
Iggy comentaria ainda que a letra de "Search And Destroy" foi escrita baseada em uma reportagem na revista Time sobre o Vietnã, que lia no parque de Kensington Gardens, debaixo de um carvalho enquanto raspava uma pedra de China White, heroína chinesa de grande pureza. Também sobre a canção, Iggy comenta "Eu sempre achei que 'Heart Full of Soul' (dos Yardbirds) era uma boa canção e fiquei pensando do que o meu coração seria cheio? Eu decidi basicamente que ele é cheio de napalm". James Williamson reaproveitou o núcleo e riff de "RG Jones At Wimbledon" somando-a com a nova letra e assim nasceu "Search And Destroy".
"Penetration" teria sido inspirado em certas passagens de dois livros de William Burroughs, "Soft Machine" e "The Ticket That Exploded". Já "Gimmie Danger" é supostamente uma análise autobiográfica, com Iggy procurando interpretar a canção com uma voz barítona no melhor estilo Jim Morrison. "Your Pretty Face Is Going To Hell", cujo título original foi "Hard To Beat", ele escreveu para uma menina que ele andou traçandoenquanto esteve em Londres e que o enchia o saco de tão presunçosa.
Política Interna da Mainman
No verão de 1972, a MainMan foi oficialmente batizada. Tony DeFreis era o chefe-executivo e Tony Zanetta, presidente da filial nos Estados Unidos. Leee Black Childers era o seu vice e Cherry Vanilla, diretora de publicidade. Na Inglaterra, ficava Corinne Schwab, que anos depois seria o braço-direito de Bowie, após este romper com DeFries. Os artistas contratados eram, além de Bowie e os Stooges, o Mott the Hopple e Annette Peacock. Todos recebiam um salário semanal.
O salário, aliás, foi motivo de várias brigas. Uma passagem interessante é relatada por Ron: "Um dia, conversando com Trevor e Woody, que eram baixista e baterista do Spiders from Mars, banda de Bowie, começamos a falar sobre dinheiro. Trevor perguntou quanto eu ganhava por semana e eu disse que era US$ 150. O homem ficou maluco e começou a gritar que eles ganhavam apenas US$ 75, sendo que eram integrantes do espetáculo mais quente do momento. Descobrimos que Mick Ronson (guitarrista do Spiders) ganhava US$ 2.000, e que David uma porcentagem da bilheteria de cada show. Isso foi o mesmo que DeFries tentou fazer conosco: um salário fixo para nós e uma porcentagem para Iggy a cada show. Ele queria fazer com James o mesmo que acontecia com Mick, mas Iggy não permitiu e todos nós recebíamos a mesma quantia". Mesmo assim, Iggy ganhava um extra da MainMan, que também pagava o aluguel dos instrumentos, aluguel da casa, além de um carro com motorista para o grupo.
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Todos os ganhos de seus artistas eram pagos em cheques nominais para MainMan, com DeFries retendo o dinheiro para despesas internas enquanto pagava a seus artistas salários fixos. E para manter o esquema, quando as queixas aconteciam, jogava a culpa para outro artista. Para Bowie, DeFries dizia que Iggy precisara de tratamento dentário. Para Iggy que queria tocar para um público, dizia que não havia a mesma demanda para a sua banda, como havia para Mott the Hoople.
Ziggy Stardust Versus The Stooges
Enquanto David Bowie excursionava, Iggy, James e Scott compravam codeína líquida na farmácia da esquina e Ron fumava haxixe escondido pelas ruas de Londres. Codeína é um alcalóide narcótico, sem odor ou cor, cuja composição química é C18H21NO3. Trata-se de um derivado da morfina (que por sua vez vêm do ópio), e é usado na medicina como um analgésico para fortes crises de tosse. Sua sensação de bem estar é altamente hipnótica.
Todo este uso consumia quase metade do salário semanal de cada um. Ron Asheton também passou a manter um relacionamento sexual com Angela Bowie, funcionária da MainMan cuja função era de atender as necessidades dos Stooges e de Lou Reed. Em setembro, DeFries e toda a cúpula de sua empresa viajaram para os Estados Unidos, com a finalidade de trabalharem na parte americana da turnê de Ziggy Stardust, deixando os Stooges por conta própria em Londres. O grupo se sentiu neglicenciado e, em represália, começou a quebrar a casa alugada em que viviam e brigando com os vizinhos.
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Foi um período duro para o grupo, já que Bowie era a estrela de 1972 e ocupava toda a atenção da MainMan. "Uma vez Tony foi na nossa casa e desceu até o porão. Me viu construindo algo e perguntou o que era. Disse que era a ponte do Rio Kwait e que me sentia como Alec Guiness. Ele perguntou porque eu a tinha construído e disse que era para destruí-la depois. Eu estava cheio de tédio e vontade de tocar e comecei a berrar com ele, chamando-o de cretino e implorando por uma apresentação. Ele só pensava em David e em Ziggy".
Mas a ascensão de Bowie foi lenta, já que Ziggy foi crescendo gradualmente, pois David não era uma grande estrela até o advento de seu mais emblemático personagem. Pensando assim, Iggy foi falar com DeFries usando o argumento que se investissem nele e em seu grupo, poderia acontecer o mesmo. Ron relata uma reclamação geral do grupo: "Nós vivemos nessa casa bacana, cheio de conforto e não fazemos outra coisa a não ser ensaiar. A banda está afiada e nada acontece. Nós chegamos para o Tony e imploramos para fazermos alguns shows, mas o desgraçado nos ignorava. Ele só pensa em Bowie, Ziggy, América e dinheiro. Ele estava cagando para nós, se quiser saber minha opinião".
E Ron não estava longe da verdade, pois para a MainMan o artista principal precisa ser melhor aproveitado e para isso, deve ostentar uma grandeza e riqueza imensas. Portanto, David poderia viver na ostentação, enquanto os Stooges eram desprezados. Uma das razões para o esquecimento da banda era que Tony não queria que os dois grupos fizessem shows ao mesmo tempo, com medo de que Iggy e David fossem alvos de comparações.
Gravando o Disco
A intenção original da DeFries e Bowie era de se ter Iggy Pop com uma banda inglesa, que eles poderiam monitorar e controlar. Bowie produziria o disco e certamente daria uma canção como fez com Mott the Hoople, que provavelmente seria o sucesso comercial que daria ao grupo validade pop e impulso para vendas de ingressos e exposição na mídia. Iggy não quis nada disso, recusando tudo que era oferecido.
"Não queremos David toda noite no estúdio conosco. Ele vai acabar querendo o controle do que estamos gravando". Sendo assim, resolveram que Iggy seria o produtor e que David cuidaria da mixagem, já que David era talentoso e saberia como melhorar o som do grupo. Ele ajudaria muito as vendagens com seu nome estampado no encarte, já que Bowie era a estrela do momento como Ziggy Stardust. DeFries estava arrependido de ter se metido com Iggy e aparentemente foi Bowie quem, exercendo sua força, fez DeFries dar o sinal verde para o grupo gravar o seu álbum.
Stooges 72: Ron, Iggy, Scott, James
Stooges 72: Ron, Iggy, Scott, James

A MainMan garantia que eles teriam um sem-número de horas para trabalharem nos estúdios da CBS. Os quatro ficavam de cinco a seis horas diárias tocando. Iggy e os Stooges entram no estúdio e sozinhos gravaram em setembro o que acabou se tornando o último álbum dos Stooges, tudo feito rapidamente, já que todas as sessões levaram apenas doze dias.
Nenhum representante da MainMan apareceu durante este tempo e Iggy é o primeiro a dizer que foi melhor assim, sem o uso de drogas durante este período, Iggy apenas bebericando um Vermute para manter a voz aquecida. Nem para groupies ou namoradas foram permitidas acesso ao estúdio durante as gravações, regras impostas por Iggy e respeitadas pelos demais.
Uma vez gravado, Iggy imediatamente começou a mixar o disco, e já cansado de tanto ouvir o material, não conseguiu dar um som adequado. Segundo ele mesmo admite, a mixagem soava muito amadora. DeFries, que já não gostava das composições, da banda e muito menos de seu exigente e irritante artista principal, não admitiu lançar o disco mal mixado desta maneira e como única opção, deu a Iggy o ultimato de confiar no trabalho de Bowie.
Dispensando os Stooges
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Enquanto Iggy esperava David Bowie poder encontrar tempo para mixar o seu disco, e o outono já chegava, a ordem foi dada para o resto dos Stooges retornarem para Detroit. DeFries estava cansando de aturá-los e imaginava ser mais fácil lidar apenas com Iggy. Eles tinham destruído a casa, incomodado todos os vizinhos e a MainMan simplesmente não tinham mais aonde colocá-los.
E sendo assim, sem intenção de lidar com os Stooges mais do que estritamente o necessário, manteve Iggy em Londres e dispensou a presença dos outros três. Com receio de que, com as passagens nas mãos, Williamson e os irmãos Ashetons provavelmente as venderiam para comprar drogas, colocou alguém responsável por segurar as passagens e levá-los até Ann Arbor.
Esta pessoa foi Angela Bowie, que uma vez em Ann Arbor, resolveu permanecer na cidade para verificar as maravilhas da cena musical do lugar, que tanto seu marido David Bowie falava. Enquanto em Ann Arbor, Angela acabou tendo um caso com James Williamson. Como ela ainda não fazia uso de heroína, achou tediosa a companhia, sintetizando a relação como momentos de prazer seguidos por horas de tédio esperando o namorado sair do banheiro onde se trancava para injetar a droga. Angela largou Williamson e voltaria a ter um romance relâmpago com Ron Asheton, com quem ficou por mais algumas semanas até este lhe apresentar ao amigo Scott Richardson.
Angela diria que estava quase pronta para retornar a Londres quando conheceu e acabou se apaixonando por Scott Richardson, vocalista da banda SRC. Richardson gostava de cocaína, uma droga muito mais social e de seu agrado. Angela e Scott ficariam juntos pelo o resto da estação, onde, a esta altura, de tão ligados, passariam, como tantos outros, a misturar cocaína com heroína para ajudar a acalmar. Logo, Richardson também estará viciado em heroína e Angela igualmente começaria a criar uma dependência. Com o inverno prestes a chegar, Angela retorna para a Inglaterra levando consigo Scott para sua casa em Oakley Street, Londres, onde encontra David Bowie e Mick Jagger dormindo juntos em sua cama de casal. Scott Richardson acabaria morando em Londres por um ano, circulando com Angela e David.
Desafiando DeFries
Durante meados do mês de outubro, Iggy voou para Los Angeles com todas as fitas de "Raw Power" para encontrar todo o staff da MainMan e Bowie hospedados no hotel Beverly Hills. A ostentação era imensa, pois todo os integrantes viveram em luxuoso bangalôs durante os dez dias que lá ficaram. No mês seguinte, chegaram a Los Angeles todos os demais integrantes dos Stooges para se juntar a ele. Enquanto Bowie continuava sua turnê pela América, Leee Childers ficou de arranjar uma casa para os Stooges em Los Angeles.
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Leee conta que Iggy não quis nenhuma que lhe foi oferecida e saía com uma limousine do hotel, com todas as despesas pagas pela MainMan por toda Beverly Hills procurando um canto, até achar um no alto de Hollywood Hillls, subindo a Mulholland Drive, que acabou sendo alugada ao custo de US$ 900 mensais, sendo uma casa de quatro quartos com piscina no alto dos morros de Hollywood, em Torrenson Drive. Ron comenta sobre como era viver naquela casa, "No inicio era ótimo, voltávamos dos ensaios e havia mulheres nuas na piscina. Uma vida clássica de rock'n'roll: groupies nuas na piscina, um Cadillac na garagem, sendo pagos, empregadas e maconha à vontade".
Os Stooges tocaram no Whiskey A-Go-Go, com direito a boquetes no banheiro entre os sets. Puro rock'n'roll, no melhor estilo Dionístico que Los Angeles tinha para oferecer no início da década de setenta. Várias das groupies mais conhecidas desta era, como Miss Christine da GTO's, Sable Stark e Laurie Maddox, circularam entre os Stooges durante este período.
Leee tinha sido incumbido por DeFries de ser uma espécie de babá do grupo, passando a morar no apartamento em cima da garagem da casa, o que seria a casa do motorista particular. Dentre suas obrigações estava a de vigiar as despesas e estrepulias do grupo. organizar e agendar ensaios e gravações e só fariam algumas apresentações se o chefe assim mandasse. Mas Tony estava preocupado com a segunda parte da turnê de Ziggy, aberta no suntuoso e elegante Rádio City Music Hall, em Nova York, no dia 14 de fevereiro de 1973. Iggy estava cada vez mais irritado com a situação e um dia reclamou para Childres. Leee conta que o cantor se sentia umbibelô de David, que nunca o via e estava ficando cada vez mais inseguro e aborrecido. "Ninguém de nós ousava desafiar DeFries, que era uma espécie de Deus e eu não ia aborrecê-lo com isso. Iggy percebeu a inutilidade em se queixar comigo e resolveu não falar mais sobre suas frustrações".
Enquanto isto, as loucuras em Hollywood envolvendo os Stooges continuavam. Iggy, de tão chapado, invariavelmente caía na piscina e quase morria afogado, enquanto os demais viam e sequer se importavam com o que acontecia com ele. Leee Childers, que nunca aprendeu a nadar na infância, acabou aprendendo depois de adulto de tanto ter que entrar na piscina para salvar Iggy antes de morrer afogado.
Por outro lado, Childers havia se apaixonado por um rapaz que ele trouxe para casa certa noite e deixou ficar morando lá com ele. Assim, a regra pré-estabelecida de que as mulheres que os Stooges arrumavam não poderiam mais passar a morar lá foi por água abaixo. Como sua assistente havia a belíssima Cyrinda Foxe, que andou com David Johansen dos New York Dolls antes de vir para Los Angeles. Ficou por um tempo com David Bowie até ser dispensada, então foi procurar Leee e a residencia dos Stooges. Ela foi a primeira a passar a morar com James Williamson, pessoa que hoje ela despreza e com o qual se arrepende de ter dormido. Cyrinda voltaria para Nova York e os braços de David Johansen. Mais tarde, ela iria casar com Steve Tyler, do Aerosmith.
Foi durante o show no Whiskey A-Go-Go que os Stooges conheceram Sable Stark e Laurie Maddox. As duas chegaram para Iggy e Ron e casualmente pediram permissão para fazerem sexo oral com eles. Sable era uma groupie de quinze anos de idade que passou a ser conhecida no circuito depois de ser vista aos sarros com David Bowie. Ela também passou a viver na casa dos Stooges, alternando suas atenções ora para com Ron, depois com Iggy, voltando para Ron, depois Iggy, de volta para Ron, mudando para o Scott e voltando novamente para Ron.
Um dia Sable traz consigo Corel Starr, sua irmã, uma menina dita menos volátil que Sable, que acabou ficando de vez com Iggy Pop, até que suas loucuras ficassem insuportáveis. Existem inúmeras histórias deestripulias variadas que tem Iggy Pop em seu enredo durante sua estada em Los Angeles em 1973. Por exemplo, Iggy e Corel passeando com Rodney Bingerheimer, figura influente em Los Angeles, DJ e mestre de cerimônias no Whiskey A-Go-Go, com Iggy e Corel no banco de tras e Rodney ao volante, conversam em seu conversível a caminho do Lava-A-Jato mais proximo. Uma vez o carro passa ser lavado automaticamente pela maquinaria, Rodney é surpreendido ao ver Iggy e Corel transando no banco de trás sem maiores pudores. Diria ele: "eu já vi muitas coisas, mas nunca tinha visto aquilo".
A Mixagem de Bowie
Em março de 73, David Bowie voltou para Los Angeles para dois concertos (Long Beach e no Hollywood Palladium) e como havia uns dias até o início da turnê pelo Japão, trancou-se com Iggy em um estúdio no Hollywood's Western Sound Studio para trabalhar na mixagem do novo disco. Este era um estúdio velho com uma mesa de mixagem de quase dez anos de idade. Sozinhos, Bowie e Iggy, acompanhados apenas de um assistente de Bowie chamado Stewart, mixaram o novo disco, já chamado de "Raw Power."
Bowie teve um certo trabalho com as gravações e começou a orientar para algumas mudanças que acreditava serem necessárias. Iggy começava a brigar com David dizendo que ele estava desperdiçando boas idéias gravadas e querendo sabotar o disco. Ron reclamaria anos depois sobre o que foi feito na mixagem: "Nós tínhamos uma mixagem que era muito melhor do que a que Bowie havia feito, com o baixo e a bateria mais presentes. Todo mundo falava que a mixagem dele tinha ficado estranha porque David e Iggy estavam chapados de cocaína, mas na verdade foi Bowie que fodeu com tudo".
Sobre sua mixagem original, Iggy comentaria: "eu queria que as músicas saíssem dos alto falantes agarrando o ouvinte pela garganta, jogar sua cabeça contra a parede e basicamente matá-lo. Era o que eu queria, mas não importa o quanto eu tentasse, nunca conseguira fazer os agudos machucar o suficiente, nem o baixo ou fazia o bumbo ser forte o suficiente, e assim por diante, mixagem após mixagem. Basicamente eu perdi a perspectiva - artistas fazem isso. E provavelmente as drogas também deixaram tudo fora de proporção".
Por conta da reedição para CD em 1996, Iggy comentava sobre o trabalho de Bowie já com outra perspectiva: "ele ouviu cada instrumento de cada canção e conversava comigo a respeito. Eu lhe explicava o que eu queria e tentava colocar isso dentro da devida perspectiva adicionando seus retoques. Em retrospecto, acho que os pequenos retoques dado por Bowie na mixagem ajudaram".
Fazendo Seu Papel
Iggy no Henry and Edsel Ford Auditorium
Iggy no Henry and Edsel Ford Auditorium

No dia 27 de março de 1973, a banda finalmente realizou um show, em Detroit, onde foram recebidos como grande entusiasmo, no Henry and Edsel Ford Auditorium, local normalmente usado apenas pela Orquestra Sinfônica da cidade. Iggy deu várias entrevistas em rádios locais e, em uma delas, aprontou mais uma das suas. Sua imagem ainda é o de homem louco e dentro de seu papel de artista, existe a necessidade de manter a imagem, o que o público espera de você. No caso de Iggy, se esperam loucuras inimagináveis.
Iggy, como um artista perdido dentro de seu papel, muitas vezes acaba seguindo seu instinto animal e fazendo bobagem nos lugares menos apropriados. Durante a transmissão, Iggy ficou completamente nu, comentando no ar que estava sem roupa, coçando o saco e tocando uma punheta. Depois, para coroar o evento, se trancou no elevador da emissora com a cantora Cherry Vanilla e tentou estuprá-la. DeFries estava presente e quase o demitiu, mas foi acalmado e a apresentação dos Stooges foi memorável, com Iggy dando um grande espetáculo.
Ainda Em Detroit
Típica produção Tony DeFries, limousines e muita badalação - James Williamson

O show de 40 minutos teve basicamente o repertório de "Raw Power", mas por ordem de DeFries não voltaram para o bis. Quanto ao show, os Stooges foram novamente suberbo no que se propõem. O crítico Glenn O'Brein escreveria: "Iggy continua sendo o nome. Ele projeta perigo como nenhum outro roqueiro. Ele caminha pela fina lâmina que divide o entretenimento do ataque, trazendo as raízes violentas do rock a mostra(...)o que assistimos em Detroit foi um dos melhores shows de rock de todos os tempos".
Dali foram para duas festas, uma atrás da outra. Apesar de MainMan providenciar uma mesa farta para os jornalistas, a banda foi retirada rapidamente do local, proibidos de serem entrevistados após o show. Enquanto as pessoas da produtora MainMan comiam e bebiam com jornalistas para promover Iggy, os Stooges e a empresa, o quarteto de músicos que compõem os Stooges ficaram trancafiados em seus quartos de hotel.
Tony DeFries queria novamente se livrar dos Stooges, achando que assim, poderia passar a controlar Iggy Pop melhor. Ele era radicalmente contra o uso de drogas, ainda mais heroína, que via como um elemento nefasto para a imagem do artista no mundo dos negócios. Desta vez ele começou com o guitarrista James Williamson. Procurando semear discórdia interna, Tony havia dito a Williamson que Iggy queria substituí-lo. Houve uma pesada discussão entre James e Tony, que desprezava o uso de drogas pelo guitarrista, e deu um ultimato para que parasse com tudo ou seria demitido.
O Novo Integrante
Os Stooges obviamente ignoraram as ameaças de DeFries e retornaram para Los Angeles com algumas novas idéias para colocar em pratica. James Williamson começa a fazer a cabeça de Iggy para arrumar um pianista para melhorar o som da banda. Juntos, concordam com um nome, Bob Scheff, pianista do The Prime Movers, com quem Iggy tocara no início de sua carreira.
Iggy telefona para Scheff, que usava o nome artístico de Blue Gene Tyranny, e o convida a vir a Los Angeles para conversarem. Alguns dias depois, durante este papo, Iggy fala sobre sua vontade de buscar as boas sensações que a música lhe proporcionava ainda nos velhos tempos em Ann Arbor. Que ele estava tentando se livrar da dependência das drogas e da situação de seus negócios com a MainMan, e que gostaria de tê-lo como novo integrante. Bob Scheff concordou em princípio e começaram a ensaiar juntos. A nova formação gravaria números para o que seria o quarto disco dos Stooges, segundo com a gravadora CBS. Alguns dos títulos gravados nesta época dão uma amostra da realidade de excessos que Iggy Pop e os Stooges estavam vivendo: "Pin Point Eyes", "Johanna", "Open Up And Bleed", "I Got A Cock In My Pocket", "Rubber Legs" e "Head On".
A Demissão
A casa em Hollywood Hills era um antro de groupies e junkies. Havia copos quebrados dentro da piscina, nego se injetando à luz do dia no quintal, problemas com roubo, um aborto, e mais uma série de outros problemas até certo ponto rotineiros que incluíam as ocasionais tentativas de suicídio para chamar atenção por parte da Sable. Ninguém queria mais ficar sistematicamente cuidando e resolvendo estes transtornos que os Stooges viviam trazendo para a empresa MainMan. Apesar de Leee Childers implorar que a banda mantesse uma certa discrição, rolava de tudo, menos isto.
Quase dois meses depois da briga em Detroit, DeFries voltou a bater na tecla de que a MainMan não manteria em seu catálogo nenhum artista que faça uso de entorpecentes. E ficou então o impasse onde ou James Williamson saía da banda ou a MainMan anularia o contrato vigente com Iggy Pop e os Stooges. James não aceitou a chantagem e pediu demissão. A banda começou a trabalhar então com um músico de estúdio chamado Sky Warnklein, que usava o nome artístico de Tornado Turner.
Portanto The Stooges têm agora uma formação com Iggy Pop nos vocais, Tornado Turner na guitarra, Blue Gene Tyranny nos teclados, Ron Asheton no baixo e Scott Ashton na bateria. Um show foi marcado com a nova formação em Tennessee, em uma casa chamada Mother's. Seria a primeira vez que os Stooges tocariam em Nashville, porém não a última. Depois deste show, Iggy ficou incontrolável e começou a rugir e beber e abusar com drogas novamente. Ele queria a volta de James Williamson e só conseguiu desagradar ainda mais DeFries.
Mesmo estando no Japão, Tony DeFries deu a ordem por intermédio de Leee Childers para que se vasculhasse o quarto de Iggy a procura de provas que eles estariam usando entorpecentes, pois assim a MainMan teria como romper o contrato por justa causa. Childers encontrou uma colher queimada, naturalmente utilizada para cozinhar a heroína antes de injetá-la, e depois só lhe restou informar Iggy e a banda. O acordo entre a MainMan e os Stooges estava desfeito. Quando Bowie soube do ocorrido, ficou apreensivo, mas percebeu que Iggy só seria Iggy à sua maneira. Em menos de três anos, ele também iria deixar a MainMan e Tony DeFries de lado e seguir sua carreira sozinho.

A História do Burzum: Parte VI - A Música

Nos últimos oito meses tenho recebido muitas cartas de pessoas interessadas em saber, entre outras coisas, quais instrumentos usei nas gravações dos álbuns do Burzum. Pessoalmente, não estou nem um pouco interessado nessas coisas e, portanto, não tenho motivação para responder a essas cartas. Para mim, isso é como um eco do passado, quando “todo mundo” na cena Death Metal underground falava sobre essas coisas. O foco nos instrumentos, marcas, estúdios de som e “produção” é, na verdade, uma das coisas contra as quais me rebelei em 1991. Mas como as pessoas que nunca obtiveram uma resposta reclamaram sobre a minha falta de vontade para responder a elas, escreverei um artigo sobre esse assunto que, espero, responderá a todas as suas perguntas.



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Nas gravações de todos os álbuns do Burzum, eu usei uma velha (acho) guitarra Weston que comprei bem barato em 1987 de um conhecido meu. O baixo que usei era o mais barato que havia na loja e nem sei de que marca era. Eu nunca verifiquei e nem mesmo pensei sobre isso. No caso da bateria, eu simplesmente pegava emprestado um kit do baterista do Old Funeral (depois do Immortal), ou de outro músico que morava por perto e, “claro”, também não tenho nem idéia de que marca era.
Já no caso dos amplificadores para guitarra, todos os caras ligados ao Death Metal diziam-me que a única maneira de conseguir o som “correto” (da moda) era usando amplificadores Marshall mas, como eu não gostava daquele som, eu usava um amplificador Peavey. No "Filosofem" eu nem cheguei a usar um amplificador para guitarra; ao invés disso, usei somente o amplificador do aparelho de som de meu irmão (que, claro, não tinha sido projetado para esse uso) e alguns velhos pedais empoeirados.
Para “cantar”, eu usava qualquer microfone que o técnico de som me fornecia ou – quando gravei "Filosofem" – eu pedi o pior microfone que ele tinha e acabei usando o microfone em um headset.
Para gravar o álbum de estréia (em Janeiro de 1992), gastei somente 19 horas no total, desde o momento em que cheguei no estúdio com os instrumentos até a masterização (!). O número de horas gastas (em 1992) no "Det Som Engang Var" (DSEV) foi um pouco maior, 26, porque não havia ninguém para me ajudar a transportar os instrumentos e coisas desse tipo e, portanto, tive que carregar e preparar tudo sozinho. A gravação de "Hvis Lyset Tar Oss" (HLTO) aconteceu em Setembro de 1992 e levou algo entre 20 e 30 horas (não me lembro), mas isso incluiu gravar duas músicas que nunca foram incluídas no álbum (uma versão muito ruim da faixa "Burzum" ["Dunkelheit"] e uma outra que nunca usei). "Filosofem" foi gravado (em Março de 1993) em apenas 17 horas, mas isso se deveu principalmente ao fato de eu ter usado um kit de bateria que já estava lá – no estúdio, e que tinha sido usado por alguma banda de jazz ou rock no dia anterior – então isso me poupou muito tempo. Além disso, naquele momento eu já havia passado pelo processo de gravação de um álbum algumas vezes, então toda a parte técnica já havia se tornado rotina.
A razão para eu ter usado o estúdio Grieghallen era que tínhamos usado aquele estúdio quando gravamos um EP com o Old Funeral, acho que em 1990, então eu conhecia o técnico de som (um cara bastante positivo, habilidoso e gente fina que morava em Bergen), e ficava localizado a apenas 1,5 km de meu apartamento em Bergen. Se eu morasse em outra cidade eu, obviamente, usaria outro estúdio.
Quando gravei o álbum de estréia, tanto Øystein Aarseth ("Euronymous", do Mayhem) quanto Harald Nævdal ("Demonaz", do Immortal) estavam presentes na maior parte do tempo e eles me ajudaram a carregar os instrumentos – e, por gozação, deixei que Aarseth tocasse um solo de guitarra na faixa "War". Ele também (além de mim) “bateu com os punhos” em um grande gongo no Grieghallen para fazer algum som. Isso foi usado como som ambiente na faixa "Dungeons Of Darkness" e na intro do DSEV.
Quando gravei os outros álbuns, eu normalmente estava sozinho com o técnico de som. Porém, Samoth (Thomas Haugen, do Emperor) estava presente quando gravei duas das faixas do mini-LP "Aske" e partes do HLTO. Ele tocou baixo em duas faixas do "Aske" e estava presente quando gravei as partes de bateria do "Aske" e do HLTO. Ele tocou baixo em "Aske" porque, por um curto período em 1992, eu cogitei a idéia de tocar ao vivo e, portanto, ensaiei uma ou duas vezes como banda (um cara chamado Erik Lancelot, dos arredores de Oslo, deveria tocar bateria). Mas eu rapidamente acordei da “psicose de tocar ao vivo” e, felizmente, mudei de idéia e continuei como antes, como uma banda-de-um-homem-só que não precisava de músicos de estúdio.
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Com exceção de uma música no HLTO e outra no "Filosofem" eu gravei tudo na primeira tentativa. O problema com a música do HLTO era técnico e eu tive que gravar a bateria da faixa título duas vezes e, na faixa "Jesu Død" do "Filosofem" eu tive que gravar uma linha de baixo novamente porque eu estava cansado depois de ter gravado as duas faixas de guitarra (meus “dedos de burguês” não estavam acostumados a todo aquele trabalho...).
Os erros cometidos em algumas das faixas durante as gravações poderiam ter sido evitados facilmente se eu tivesse me preocupado em regravar certas partes, mas naquele momento o que eu queria era me rebelar contra a música (Death) Metal polida e convencional. A principal motivação da rebeldia musical era não fazer álbuns “perfeitos”, não fazer música com “esta ou aquela” marca de instrumentos, era não ir a um determinado estúdio para conseguir “esse ou aquele som” e também era não soar como outras bandas. Alguns poucos erros tornam a música mais viva e pessoal, o que simplesmente dá à música “alma” e originalidade, então nunca me preocupei em corrigir coisa alguma. A música nos álbuns do Burzum é simplesmente uma honesta, sincera, simples e clara representação da minha pessoa. Certamente não sou perfeito ou livre de erros, e nem minha música.
Havia uma ideologia por trás disso; era a aceitação da honestidade e a apreciação do que era puro enatural. Se o som não é definido como bom por algum músico de queixo empinado (frustrado) que trabalha para alguma revista de música, isso não significa coisa alguma para mim. O natural é sempre o melhor, seja quando estamos falando de música ou de qualquer outra coisa. A música natural e de melhor qualidade é (da forma como vejo) música com “alma” e não música que foi trabalhada por meses em um estúdio para remover até mesmo os menores erros (peculiaridades).
Mesmo em 1990 a maior parte das bandas de Death Metal seguiu a corrente, foi incorporada na indústria da música comercial e perdeu toda a sua “alma”. As assim chamadas bandas de Black Metal logo em seguida seguiram essa tendência e, (até onde eu sei) com exceção de Fenris do Darkthrone, todas elas se venderam e deixaram de honrar as idéias originais do Black Metal. As bandas mais jovens da Noruega, que surgiram em 1993 ou depois, em razão da cobertura da mídia sobre nosso mundinho, nunca souberam coisa alguma sobre essas idéias então, ironicamente, elas nunca se venderam realmente. Entretanto, chega a ser um pouco idiota o fato de fazerem essas coisas e terem uma certa aparência sem nem saberem por quê. Elas apenas se juntaram a um bando e nunca souberam de onde esse bando surgiu ou onde esse bando esteve antes de se juntarem a ele. Em resumo, podemos dizer que as tão faladas bandas de Black Metal também se comercializaram.
Neste ponto devo lembrar a Você daquilo que escrevi no começo deste artigo; pessoas me perguntavam coisas, como quais instrumentos eu usei nas gravações dos álbuns do Burzum. Tais perguntas são tão irrelevantes e desinteressantes para mim quanto perguntas sobre que marca de calça ou de cueca eu usei quando gravei os álbuns. Será que realmente importa saber que instrumentos eu usei? Eu não acho, e penso que é importante não se preocupar com essas coisas. Eu usei a minha guitarra e, se eu tivesse outra guitarra, teria usado essa outra. É simples assim. Eu usei o que estava à mão e minha principal prioridade era fazer música honesta e original – e eu poderia ter conseguido isso com qualquer tipo de instrumentos, não importando sua idade, preço e marca. É simples assim.
Eu gostaria de agradecer a Você pelo seu interesse no Burzum e pela sua atenção mas, por favor, não espere que eu dê prioridade a cartas com perguntas sobre instrumentos, detalhes técnicos ou outras coisas pelas quais não tenho interesse algum. Se Você acha essas coisas interessantes, para mim tudo bem, mas não espere que eu tenha os mesmos interesses que Você.
Varg "Волк" [N.: “O Lobo”] Vikernes
(Julho de 2005)

Aurum nostrum non est aurum vulgi!
(O nosso ouro não é como o ouro do homem comum)